O que são as experiências de crise?

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Por: Heitor Alves

Existem crentes que dão muita ênfase às experiências pós-conversão, principalmente aquelas experiências advindas do batismo do Espírito Santo. Por outro lado, há muitos crentes (entre eles alguns reformados) que não dão a mínima às experiências de crise, e ainda criticam aqueles que passam ou já passaram por algo semelhante.

Não temos o direito de tirar ou minimizar as experiências de alguém. Não podemos incentivar as pessoas que rejeitem quaisquer experiências de crise que estão tendo ou venham a ter. Ninguém pode fazer isso. Somente a pessoa que passa por uma experiência sabe o que sentiu, e isso por si só nos impede que procedamos de maneira legalista, opinando, criticando e julgando experiências espirituais individualistas.

Nossa crença, como crentes calvinistas reformados, é que a Bíblia é o nosso único guia na doutrina, na prática e na experiência. De acordo com as Sagradas Escrituras, nenhuma experiência pós-conversão é prometida, ou apresentada, aos crentes. Mesmo assim, há crentes que fazem questão de afirmarem terem tido uma experiência de crise, porém, que tipo de experiência tiveram? O que causou esta experiência?

Talvez tiveram uma experiência de fortalecimento, ou uma experiência santificadora. Talvez as pessoas tenham tido apenas uma experiência de segurança. Ou talvez alguém tenha tido uma experiência de muita tristeza por ocasião de algum pecado não confessado, ou por ocasião de pecado constante na vida. Ou podem ter uma experiência de crise relacionada com vida espiritual morna, que deveria ser mais atuante.

As Escrituras nos encorajam a ter uma experiência específica, a da própria conversão. Isso equivale ao crescimento na graça e no conhecimento. Regeneração, conversão, justificação são os únicos fundamentos experimentais sobre os quais somos encorajados a construir.

1. Em alguns casos, a experiência de crise é a experiência da conversão.

A situação calamitosa do clima evangélico em nosso meio está tornando a conversão como uma experiência simples, fácil e sem deixar "marcas". Multidões têm "decididos" por Jesus em várias reuniões; são trazidas às igrejas com uma falsa segurança. E de uma hora pra outra, as pessoas se "tornam vivas" através de palavras "mágicas" do pastor. Das duas, uma: ou essa "palavra mágica" pode ser alguma promessa material para esta vida. Aliás, tudo se resume ao "aqui e agora". Ou pode ser o pronunciamento de algumas palavras, sem nexo e sem sentido, para estimular a emoção da pessoa e "forçar" que essas palavras sejam pronunciadas rapidamente, produzindo êxtase e um descontrole mental significante, ao ponto de fervilharem as emoções. Tudo isso para a pessoa acreditar que foi "movida", ou "enchida" pelo Espírito.

O que chamam de "segunda bênção" ou "consagração" é, na verdade, a primeira e grande bênção do novo nascimento. É muito comum notarmos em nosso meio a prática de induzir falsas profissões de fé, utilizando chamadas do púlpito ou instando as pessoas a vir para a frente, pressionando-as a tomar uma decisão. A teoria de uma misteriosa e súbita transição do crente para um estado de bem-aventurança, é algo que não encontramos base bíblica para isso.

Outra situação bastante comum entre os evangélicos é a prática de aceitar muitas pessoas espiritualmente sem vida como cristãos, baseado no testemunho de que aceitaram a Jesus como Salvador, mas não como Senhor. São pessoas que estão indispostas a "aceitarem" a Jesus como Senhor e vivendo vidas deploráveis. Os falsos profetas asseguram a essas pessoas que somente o testemunho verbal garante a salvação, e lá na frente, se quiserem, podem aceitá-lO como Senhor.

Mas não podemos negar que exista uma experiência de crise real e verdadeira nas pessoas que ficam despertadas pela primeira vez e se arrependem pela primeira vez. Esta é a conversão, a primeira bênção, e não a segunda. Não podemos dizer que um homem se converteu a Cristo sem que ele se consagre para Deus.

2. Em alguns casos, a experiência de crise é a experiência do viver santificado.

Encontramos em nossos dias inúmeras igrejas que dão pouca ou nenhuma instrução doutrinária e muito menos instrução prática sobre o viver santificado. Quando crentes, pobres na doutrina, se deparam com reuniões ou conferências onde são poderosamente “movidos” pelo Senhor, subitamente encontram poder e resolução para deixar hábitos pecaminosos, arrepender-se da preguiça e da indiferença, e daí para frente avançam na vida cristã.

Muitos acham que essa santificação “instantânea” (perfeita santificação) é baseada em alguns textos bíblicos. Mas o que eles não sabem é que esses textos fazem parte da categoria que os estudiosos chamam de santificação definitiva, ou seja, na conversão, o ato de ser separado por Deus é final e de uma vez por todas.

A referência é ao significado básico da palavra grega santificar, isto é, separar (1Co 1.2,6,11; Rm 6.2). Logo após terem sido separados, segue-se a obra interna e progressiva da santificação (Rm 8.13; Cl 3.5; 2Co 3.18; 7.1; 2Pe 3.18; 1Ts 5.23). A idéia de que por um poderoso ato de consagração se possa atingir perfeita santidade é errada e antibíblica.

Pode surgir um momento em nossas vidas que estamos tão distantes de Deus, que logo somos levados a reconhecer a necessidade de nos voltarmos para Deus com nossas vidas inteiramente dedicadas a Ele. Não devemos transformar esse impulso como algo sobrenatural e místico. Não há nada de “espetáculo” nisso. Isso nada mais é do que um comportamento natural daquele que foi nascido de novo e regenerado por Deus, desejando viver uma vida de santidade adequada aos padrões de Deus após um período de negligência na vida cristã.

A conversão e a consagração são simultâneas, no sentido de que nenhuma conversão realmente acontece se não significar uma verdadeira consagração a Deus. A consagração não é um avanço a outro estágio de experiência, e sim, um retorno a um estágio anterior. Esta é a vida do cristão: cheios de altos e baixos.

3. Em alguns casos, a experiência de crise é nada mais do que emoções e sentimentalismo.

A prova da realidade espiritual é a evidência dos frutos do Espírito, e não meramente profissões de fé exterior. Do que adianta exibir todo um sentimentalismo e emoções em cultos públicos, se não mostram melhorias inerentes na qualidade de vida em casa, no trabalho ou na igreja.

As igrejas estão cheias de pessoas sentimentalistas. Bastam algumas palavras do pastor que elas logo manifestam suas tendências ao emocionalismo, com atitudes e palavras fora do controle. E chamam isso de “ação” do Espírito!

Os pastores são verdadeiros psicólogos, pois “estudam” suas ovelhas para saberem quais são mais propícias ao sentimentalismo. Logo, o resultado esperado é sempre alcançado. As pessoas são levadas a crer que, de fato, foram movidas pelo Espírito, pois a “prova” disso e que elas não se lembram de nada. De fato, a emoção toma conta da mente de tal forma que qualquer raciocínio, razão ou percepção do lugar e das coisas, é anulada. As pessoas não se lembram do que fizeram, ou do que falaram.

4. Em alguns casos, a experiência de crise representa recuperação de declínio espiritual.

Todos concordamos que existem crentes que caem gravemente. E isso é testemunhado pelas Escrituras em vários lugares. Apenas para citar, temos o Salmo 51. Este salmo poderia ser descrito como uma experiência de crise na vida de Davi. No Novo Testamento, temos o caso de Pedro que, ao negar o Senhor por três vezes, falhou miseravelmente a ponto dele sentir o terrível peso do seu pecado. Ele fraquejou na fé e estava necessitado de recuperação ou restauração especial.

A restauração dos que caem é uma realidade. Que o declínio espiritual leva à apostasia é atestado pelas Escrituras. Isso é uma grande crise espiritual. Mas a restauração é possível, acompanhada por um profundo arrependimento e tristeza (2Co 7.11).

Todos nós somos passíveis a um período de fraqueza espiritual tal, que pode até fazer-nos abandonar a fé. Mas os que são eleitos de Deus sempre voltam ao primeiro amor. O verdadeiro crente pode até cair, mas jamais apostatar definitivamente da fé.

Conclusão

Não podemos negar as experiências de crise. O que, de fato, precisamos é identificar corretamente essas experiências à luz das Escrituras. Não há nada de espetacular ou especial nestas crises. Não podemos imaginar que seja a ação do Espírito se movendo sobre a pessoa, tornando sua vida espiritual mais elevada do que antes.

Tais experiências não têm, necessariamente, qualquer ligação com a santidade de vida. Tampouco as experiências devem ser tomadas como normas. As experiências de crise de alguns personagens bíblicos, ou até mesmo de algumas pessoas de dentro da igreja, são registradas para o nosso encorajamento apenas.

O erro de muitos crentes é acharem que se uma pessoa experimentou algum tipo de experiência, essa mesma experiência deve ser sentida por outros crentes. Isso é um erro! Ninguém pode, obrigatoriamente, buscar a mesma sensação espiritual ou experiência de crise que eu tive. Eu não posso me esforçar para sentir essas mesmas sensações que outra pessoa sentiu.

As experiências são individuais. A experiência que senti é minha somente. Ela não deve ser tratada como norma na igreja, ou mesmo doutrina. Mesmo com essa individualidade, as experiências não significam um avanço em algum “estágio” na santificação.

Ressalto que toda e qualquer experiência de crise deve ser analisada pelas Escrituras. Qualquer experiência que não encontrar apoio na Palavra de Deus deve ser desconsiderada e rejeitada.

Soli Deo Gloria

Autor: Heitor Alves
Fonte: [ Eleitos de Deus ]

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