O diabo conseguiu

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Numa das cartas do Diabo a seu aprendiz, escrita em 1942, o tentador diz o seguinte: “O que queremos mesmo, e desejamos muito, é fazer com que as pessoas tratem o cristianismo como um meio; de preferência, é claro, como um meio para o seu próprio benefício”.1

Não foi preciso esperar a chegada do terceiro milênio para descobrir que o Diabo conseguiu realizar o seu intento com o maior sucesso possível. Essa é a arma da maior parte das igrejas neopentecostais. Elas não cobram o preço do discipulado; sequer mencionam tal coisa. Porém, oferecem as vantagens da fé: pensamentos positivos, destemor, sucesso empresarial, prosperidade, bens de consumo, longevidade e seus congêneres. Curiosamente, a estratégia satânica está enchendo o mundo com novos templos cristãos, e enchendo os templos cristãos com novos fiéis. O fenômeno é tal, que vários pesquisadores estão se dedicando ao assunto e escrevendo sobre ele.

No início de agosto, o caderno “Mais!”, da “Folha de São Paulo”, publicou a análise de José Arthur Giannotti, professor emérito da Universidade de São Paulo e pesquisador do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento: “O novo crente não mantém com a igreja e seus pares uma relação amorosa, não faz do amor o peso da sua existência. Sua adesão não implica conversão, total transformação do sentido de seu ser. Apenas assina um contrato integral que lhe traz paz de espírito e confiança no futuro. Em vez da conversão, mera negociação. Essa religião não parece se coadunar, então, com as necessidades de uma massa trabalhadora, cujos empregos são aleatórios e precários?”.

Menos de quinze dias depois de Giannotti, foi a vez do escritor Carlos Heitor Cony: “Grande número de igrejas se apoia na atividade carismática, fazendo ou prometendo milagres instantâneos ou a curto prazo, bastando a fé em Jesus Cristo e o pagamento do dízimo” (“FSP”, 21/08/09, E16).

As demais igrejas evangélicas querem se proteger dessa generalização e, às vezes, encontram pessoas de fora que fazem isto por elas. É o caso do ombudsman Carlos Eduardo Lins da Silva, que critica as reportagens publicadas na “Folha de São Paulo”, que “deixaram de abordar aspectos fundamentais, como quais são os traços que distinguem a IURD de outras denominações evangélicas. Isso teria ajudado a evitar a percepção de alguns leitores de que a edição permitiu confundir a IURD com as demais” (“FSP”, 23/08/09, A8).

Quando publicou as “Cartas do Diabo a seu Aprendiz”, há 67 anos, C. S. Lewis talvez não imaginou que acertaria em cheio. O Diabo conseguiu fazer as pessoas procurarem o cristianismo não em busca da justificação (aquela bênção primária que significa o perdão de Deus), mas em busca de algum proveito secular. Hoje, somos obrigados a ouvir certas pilhérias irreverentes e incômodas. Por exemplo, um guia mirim de Natal, no Rio Grande do Norte, ao apresentar a imensa catedral da Igreja Universal do Reino de Deus, disse ao turista: “Esta é a Casa da Moeda daqui...” (“O Globo”, 22/08/09, 24). A “Folha de São Paulo” (13/08/09) publicou no “Painel do leitor” a carta de Victor Medeiros do Paço: “Os fiéis que contribuem com o dízimo vão para o paraíso celeste, já os dízimos vão para os paraísos fiscais”. O próprio Carlos Heitor Cony também faz uma piada: “Maomé terminou rico, tão rico como o Sr. Edir Macedo, só que não vendia espaço na televisão, mas camelos”.

Contudo, assim como a sociedade brasileira precisa separar o trigo (as igrejas seriamente comprometidas com o evangelho) do joio (as igrejas comprometidas com o mercado da fé), os evangélicos e o povo em geral precisam separar a bem fundada e desinteressada crítica ao movimento neopentecostal da crítica motivada por interesses simplesmente empresariais. Por exemplo, o seriado que a Globo está gravando em Salvador conta a história de alguém que depois de se converter ao evangelho decide fundar a Igreja Evangélica do Tremor Divino e passa a desviar parte dos dízimos em benefício próprio (“FSP”, 19/08/09, E8).

Nota
1. Um Ano com C. S. Lewis, p. 51 (Editora Ultimato).


Abertura da Edição 321 - Novembro-Dezembro 2009
Fonte: [ Ultimato ]
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3 comentários

É tendencioso dizer que de um lado, a igreja X é trigo, do outro, a Y (diga-se de passagem, por aqui sempre citada "neo-pentecostal") é joio. Existe Joio e Trigo, independente do percentual, em ambos.
O trabalho árduo destes "neo-pentecostais"(motivados pela grana) recebeu mais empenho da parte deles do que das sérias entidades eclesiásticas (movidas apenas pelo amor a Jesus).

Ou seja: Os oportunistas apareceram por conta da enorme lacuna deixada por aqueles que não fizeram seu serviço (e ainda não o fazem, diga-se de passagem: vide a discrepância de volume de trabalho entre as duas acima citadas).

Se o dinheiro fala mais alto é que esta potestade, citada por Jesus como concorrente de Jeová("Não se pode adorar os dois")é adotada pelo homem, independente da denominação que o sujeito frequenta. E isso independe de pentecostal, livre, reformado, neo, pós,

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será que não há dúvidas que as grandes catedrais das empresas universais ainda irão servir de "centro" de concetração terrorista e atentado contra as comunidades?

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É, é triste ver como tem igrejas que usam e abusam dos fiéis que participam dos cultos. Vender a fé, vender a ida para os céus, não tem como. É algo que se adquiri, não se compra. Muitas igrejas, deveriam se envergonhar de tais atos. Pois servem à dois senhores. E eu sirvo somente à um, ao Nosso Onipotente, Onipresente, Deus, Jeová, Javé, Jesus Cristo, pois Ele é único! E vivo pelo amor Dele!

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