A comunicação do evangelho e as barreiras culturais


Por Leonardo Gonçalves

A pregação do evangelho é um desafio transcultural, isso porque a essência do evangelho transcende a cultura. Já nos seus primórdios a mensagem cristã ultrapassou a fronteira da cultura judaica, alcançando os samaritanos, os gregos e os romanos. Para pregar suas imperiosas verdades, os apóstolos e escritores sagrados não se valeram da linguagem culta dos acadêmicos, mas do grego simples falado no mercado, o koiné. Desse modo, os primeiros pregadores conseguiram quebrar a primeira grande barreira cultural, a da linguagem, e alcançar aquela população que não tinha acesso à lingua culta. Considerando que estes compunham não menos que 70% da população, podemos concluir que pregar e registrar a história e doutrina de Cristo em koiné foi uma das investidas mais sábias que a igreja já teve.

Para pregar o evangelho de modo eficaz, Jesus e os apóstolos também tiveram que romper inúmeros paradigmas da religião e cultura judaica. Se o evangelho tinha como alvo os pecadores, então era tempo de abandonar a postura asceta de ermitões religiosos e conviver com os devassos, cumprindo o chamado para ser sal e luz. Os gentios já não eram cães nem impuros, mas objeto do amor do Abba. É por isso que vemos Jesus relacionando-se com pecadores, com homens e mulheres de péssima reputação, e a estes – que eram desprezados pela religião – Ele se apresenta como caminho, verdade e vida. Convidado pelo publicano Levi, Jesus sentou-se à mesa com ladrões e falou a eles do amor de Deus. Ao passar por Samaria, se deteve junto ao poço de Jacó e falou de verdades importantes a uma mulher de vida escandalosa. A mensagem obteve êxito, e aquela mulher acabou se tornando a primeira missionária entre os samaritanos.

Em Jesus, os paradigmas transculturais começaram a desabar ainda antes do seu nascimento. A kenósis (esvaziamento por ocasião da encarnação) é o momento chave da transculturalização do evangelho. Jesus, o verbo divino, se vestiu de carne. E não era apenas uma roupagem humana; Jesus foi totalmente humano – ainda que divino. A encarnação foi o momento em que Deus abriu mão da glória eterna para experimentar a nossa humanidade. Na sua empatia, o Filho de Deus conseguiu conquistar a nossa confiança e afeto. Ele poderia vir em sua realeza, com carros e cavalos de fogo, e falando a “língua dos anjos”, mas preferiu vir como homem. Sujeito as mesmas limitações, Jesus foi igual a nós em tudo, exceto no pecado.

Nenhuma cultura, seja nacional, regional ou religiosa, pode se interpor ao kerigma de Cristo. A pregação do evangelho, tal como nos dias de Jesus, deve transpor as barreiras e imposições culturais. Quando necessário, devemos ser como judeus para os judeus, e falar como gregos aos gregos. Nossa bagagem “evangélica” nem sempre traz benefícios a “pregação evangélica”. A linguagem gospel é restrita ao guetho, portanto, eficaz somente dentro do âmbito dos seus participantes. Enquanto os nossos pregadores se mantiverem fechados no que diz respeito à linguagem e a cultura, não conseguiremos impactar a nossa gente com um evangelismo eficaz.

O verdadeiro evangelista é aquele que abre mão da própria cultura para assumir a cultura daquele a quem deseja alcançar. Jesus fez isso ao assumir a nossa humanidade. Portanto, ninguém que não seja capaz de abrir mão das suas “excentricidades evangelicalóides” em prol dos perdidos deve fazer-se chamar de evangelista, pastor ou pregador do evangelho.

Autor: Leonardo Gonçalves
Fonte: [ Púlpito Cristão
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