A DOUTRINA DA PERSEVERANÇA DOS SANTOS diz respeito à preservação da salvação do eleito. Trata-se de uma afirmação de que o que Deus começa, ele completa. Louis Berkhof definiu a perseverança dos santos como segue: "A perseverança pode ser definida como a contínua operação do Espírito Santo no crente, pela qual a obra da graça divina que é iniciada no coração, é continuada e levada à conclusão" (Systematic Theology).
Registre-se que tal perseverança é na graça de Deus e na fé, e fé definida em termos de fiducia, de confiança na suficiência dos méritos de Cristo, de descanso quanto à perfeição do seu poder para levar a salvação da pessoa à sua plena realização. A Confissão de Fé de Westminster, Padrão doutrinário presbiteriano, no capítulo 17.1, afirma de maneira suficientemente clara: "Aqueles a quem Deus aceitou em seu Amado, chamou eficazmente, e santificou por seu Espírito, nunca podem cair total nem finalmente DO ESTADO DE GRAÇA, mas, certamente perseverarão até ao fim, e serão eternamente salvos". James Montgomery Boice e Philip Graham Ryken definem a perseverança dos santos da seguinte maneira: "Ela é a verdade de que aqueles que foram levados à fé em Jesus Cristo - conhecidos de antemão e predestinados à fé por Deus desde a eternidade passada, tendo sido chamados, regenerados e justificados nesta vida e de tal modo colocados no caminho para a glorificação final que se pode falar nessa glorificação como algo já concluído - nunca serão e jamais poderão ser perdidos" (As Doutrinas da Graça. p. 177).
A doutrina da perseverança trata da imperecibilidade do relacionamento de amor, iniciado pela livre graça, entre Jesus Cristo e a pessoa. A doutrina da perseverança dos santos não ensina que, por causa da obra do Espírito Santo no coração do pecador, este está isento ou imune a cometer pecados específicos. A bem da verdade, o único pecado do qual o eleito é preservado e, por essa razão, jamais o cometerá, é a blasfêmia contra o Espírito Santo, definido pelo próprio Jesus como o único pecado, a única blasfêmia sem perdão (Mateus 12.31). Mais uma vez citando Boice e Ryken, eles fazem algumas observações a respeito do que a perseverança dos santos não significa: "1. Perseverança não significa que os cristãos são imunes a todo perigo espiritual só por serem cristãos [...] 2. Perseverança não significa que os cristãos são sempre impedidos de cair em pecado, só por serem cristãos" (op. cit., p. 178). Dessa maneira, é preciso compreender que "perseverança não significa que os cristãos não cairão, mas apenas que eles não se perderão" (op. cit., p. 178).
A perseverança dos santos não imuniza o crente de cometer determinados pecados nem estabelece um index de causa mortis inaplicáveis aos crentes. Esta bendita e gloriosa doutrina ensina que o pecado não terá a vitória final sobre o crente, a saber, quebrar a sua comunhão, o seu vínculo de amor com o doce Redentor. Jesus afirmou algo belo, em João 10.27-29: "As minhas ovelhas ouvem a minha voz; eu as conheço, e elas me seguem. Eu lhes dou a vida eterna; jamais perecerão, e ninguém as arrebatará da minha mão. Aquilo que meu Pai me deu é maior do que tudo; e da mão do Pai ninguém pode arrebatar". Algumas expressões nesse texto precisam saltar aos nossos olhos: "JAMAIS perecerão", "NINGUÉM as arrebatará da minha mão", "aquilo que o Pai me deu é maior do que TUDO" e "e da mão do Pai NINGUÉM pode arrebatar". A metáfora utilizada nos proporciona uma terna imagem pastoral da verdade de que o próprio Cristo, que nos salvou, assume a responsabilidade de me guardar da danação eterna. Ninguém pode me arrebatar da sua mão. Nem mesmo eu. Ainda que eu abra as minhas mãos, na tentativa de me soltar, ele me sustentará firme. Eu nunca me apartarei definitiva e completamente do meu Salvador. E mais, a segurança retratada na passagem é dupla, por assim dizer. Somos agarrados pelo Pai e pelo Filho.
A mesma verdade é afirmada pelo apóstolo Paulo numa passagem clássica sobre a segurança da salvação e o caráter absoluto da justificação pela fé: "Aquele que não poupou o seu próprio Filho, antes, por todos nós o entregou, porventura, não nos dará graciosamente com ele todas as coisas? Quem intentará acusação contra os eleitos de Deus? É Deus quem os justifica. Quem os condenará? É Cristo Jesus quem morreu ou, antes, quem ressuscitou, o qual está à direita de Deus e também intercede por nós" (Romanos 8.32-34). Nos versículos seguintes, o apóstolo assevera, de maneira enfática, que ninguém, absolutamente ninguém, pode separar um eleito do amor de Deus em Cristo Jesus: "Quem nos separará do amor de Cristo? Será tribulação, ou angústia, ou perseguição, ou fome, ou nudez, ou perigo, ou espada? Como está escrito: Por amor de ti, somos entregues à morte o dia todo, fomos considerados como ovelhas para o matadouro. Em todas estas coisas, porém, somos mais que vencedores, por meio daquele que nos amou. Porque eu estou bem certo de que nem a morte, nem a vida, nem os anjos, nem os principados, nem as coisas do presente, nem do porvir, nem os poderes, nem a altura, nem a profundidade, nem qualquer outra criatura poderá separar-nos do amor de Deus, que está em Cristo Jesus, nosso Senhor" (vv. 8.35-39). Chamo a atenção para dois detalhes importantes dessa passagem.
O primeiro deles é que é muito interessante a referência à "morte" no versículo 38. O apóstolo Paulo fala de morte (thánatos) de modo generalizado, ou seja, a morte, em suas mais variadas formas, não é capaz de nos apartar do amor de Deus em Cristo Jesus. O segundo detalhe é a afirmação de Paulo, no sentido de que ninguém pode nos condenar, uma vez que Jesus morreu por nós, ressuscitou por nós e está à direita de Deus intercedendo por nós (v. 34). Precisamos dar o devido peso, a devida importância à continuidade da obra sacerdotal de Jesus no céu. Ele não apenas morreu por nós na cruz do Calvário. Ele não apenas levantou da sepultura para a nossa justificação, mas ascendeu aos céus e, como coloca o autor aos Hebreus: "também pode SALVAR TOTALMENTE os que por ele se chegam a Deus, vivendo SEMPRE PARA INTERCEDER POR ELES" (7.25). Podemos contar com a intercessão do nosso precioso Redentor, inclusive no momento em que, à semelhança de Cristão, tivermos que atravessar o caudaloso rio da morte. Não podemos fazer outra coisa, senão bradar juntamente com o apóstolo Paulo: "Onde está, ó morte, a tua vitória? Onde está, ó morte, o teu aguilhão?" (1Coríntios 15.55).
Você que lê esta nota precisa se firmar nesta verdade: "O Salvador que ordenou a tua salvação antes da fundação do mundo, que enviou seu Filho para viver e morrer por você na cruz do Calvário, que enviou o seu Espírito reivindicar você como seu filho, nunca deixará você. E nem mesmo a aproximação da morte pode agora apartar você de Cristo, pois é Cristo quem te sustenta. Ele manterá você seguro no caminho para casa" (Michael A. Milton. What Is Perseverance of the Saints? p. 31).
Ah, como precisamos resgatar a devida compreensão desta bendita verdade. Na verdade, a saúde das nossas igrejas passa pela recuperação das antigas doutrinas da graça. O puritano Thomas Watson percebeu a importância dessa bendita doutrina: "O principal conforto de um cristão depende dessa doutrina da perseverança" (A Body of Divinity. p. 279).
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Autor: Rev. Alan Rennê Alexandrino Lima
Fonte: Perfil do autor no Facebook