Gratos na prosperidade, pacientes na adversidade.

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Por João Calvino (1509-1564)



As Escrituras testificam que todos os homens estão sob o poder de Deus, e que Ele pode ou torná-los bem dispostos para com Sua igreja ou evitar que sua malícia tome efeito. Ele deu aos israelitas graça aos olhos dos egípcios. Derrotou o conselho de Aitofel quando este ameaçava destruir a Davi. O diabo nada podia fazer contra Jó sem a permissão divina.

O conhecimento de tais verdades como estas nos torna gratos na prosperidade, pacientes na adversidade e maravilhosamente confiantes da nossa segurança futura. Em chegando a prosperidade, atribuímo-la à bondade de Deus, quer chegando a nós através da agência dos homens, quer através de outros canais. Quando os homens nos mostram bondade, consideramos que Deus inclinou seus corações para ajudar-nos; e quando temos colheitas abundantes, percebemos que Deus respondeu aos céus, os céus responderam à terra, e a terra respondeu ao seu produto (Os. 2:21-22).

Quando a adversidade nos sobrevém, erguemos nossos pensamentos a Deus, e o saber que Sua mão a enviou, torna-a mais eficaz para produzir a paciência, a submissão e a tranqüilidade da mente. Se José tivesse deixado que seus pensamentos permanecessem fixos na traição dos seus irmãos, nunca poderia ter reavido sua afeição por eles; mas quando considerou a providência de Deus, esqueceu-se o dano que lhe tinham feito, e disse: "Vós, na verdade intentastes o mal contra mim; porém Deus o tornou em bem, para fazer, como vedes agora, que se conserve muita gente em vida. Não temais pois; e vos sustentarei a vós outros e a vossos filhos" (Gen. 45:8 e 50:19-21).

Mas embora a vontade de Deus seja a grande causa primária, assim como está escrito: "Eu formo a luz, e crio as trevas; faço a paz, e crio o mal; eu o Senhor, faço todas estas coisas" (Is. 45:7), nenhum homem piedoso fechará seus olhos às causas secundárias. Na realidade, considerará um homem que lhe faz um ato de bondade como um agente utilizado pela bondade de Deus; mas também sentirá de todo o coração que está endividado para com o agente, e esforçar-se-á para demonstrar sua gratidão de modo apropriado e dentro das suas possibilidades. Se sofrer perda mediante sua própria negligência ou descuido, culpará a si mesmo, embora reconheça nisto a mão de Deus. Se alguém que foi entregue aos seus cuidados morrer devido doença, por causa da sua negligência, considerar-se-á culpado, embora saiba que a duração da vida é fixada pela determinação de Deus. Não fará abuso da doutrina da provldência de Deus para apresentar desculpas por nenhum pecado.

E especialmente no que respeita às coisas ainda futuras o homem piedoso prestará atenção às causas secundárias. Reconhecerá que os meios normais de cuidar da sua própria segurança lhe são fornecidos pela bondade do Senhor, e não será vagaroso em procurar bons conselhos ou assistência daqueles que os podem prestar; fará uso de vários meios como os instrumentos legítimos da providência divina, e entre todos os meios dependerá exclusivamente da providência de Deus. Princípios tais como estes nos livram de uma confiança presunçosa, nos conclamam a continuar na oração e nos fornecem uma esperança que nos eleva acima dos perigos com os quais estamos cercados.

Nisto aparece a felicidade inestimável daqueles que temem a Deus. A vida do homem é ameaçada por inúmeros perigos. Sem irmos além de nós mesmos, o corpo contém os germes de mil doenças. Se nos resfriamos, há perigo, e há perigo se ficamos super-aquecidos. Vá onde quiser — a morte está por perto. A bordo de um navio a grossura de uma prancha ou de uma viga é tudo quanto fica entre ti e a morte. Montado a cavalo tua vida depende do pé do cavalo. Andando na rua estás cercado por tantos perigos quanto há telhas nas casas. Um instrumento de ferro na tua própria mão ou na de um amigo pode causar teu fim; e há outros perigos inumeráveis que não posso deter-me para mencionar. Você diz: tais coisas raramente acontecem, e não acontecem a todos os homens. Reconheço o fato, mas desde que elas acontecem a alguns, assim lembrando-nos que o mesmo pode acontecer a nós, porventura não temos motivo para temer que realmente acontecerão? E o que pode ser pior para alguém do que estar continuamente sujeito ao temor? Desejo ressaltar que a miséria do homem seria muito grande se fosse sujeito ao governo do cego acaso.

Uma vez, porém, que a luz da providência divina tenha brilhado sobre um homem piedoso, ele não somente está libertado do medo excessivo que antes o oprimia, como também é livrado de todo o cuidado ansioso. Com razão ele teme acaso, e com calma se entrega às mãos de Deus. Está consolado ao saber que seu Pai. celestial de tal forma controla todas as coisas pelo Seu poder, de tal modo as controla pela Sua soberana vontade, de tal maneira as governa pela Sua sabedoria, que nada pode acontecer senão pela Sua ordenação. Desta forma o salmista canta: "Pois ele te livrará do laço do passarinheiro e da peste perniciosa. Cobrir-te-á com as suas penas, sob suas asas estarás seguro: a sua verdade é pavês e escudo. Não te assustarás do terror noturno, nem da seta que voa de dia, nem da peste que se propaga nas trevas, nem da mortandade que assola ao meio-dia." (Sal. 91). É por isso que os santos se gloriam na proteção divina; "O Senhor é o meu auxílio, não temerei; que me poderá fazer o homem?" (Heb. 3:6). O Senhor é meu socorro, por que temerei? Lembram-se que o diabo e todas as multidões de maus estão tão freados pela mão de Deus que nem podem formar desígnios maliciosos contra nós nem erguer um dedo para executá-los, a não ser na medida em que Deus permite, ou melhor, ordena. Resumindo, poderás facilmente ver, se considerares a questão, que ser ignorante da providência divina é a maior das infelicidades, e que o conhecimento dela traz a felicidade suprema.

Fonte: [ Josemar Bessa ]
Via: [ Tome a Sua Cruz e Siga-me ]

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