Palácio para Deus?

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                                                           Imagem: templo de Salomão, IURD, em SP.
Por Renato César


O Antigo Testamento está repleto de passagens que reiteram a importância do Templo para os israelitas. Para ele eram levadas as ofertas e sacrifícios. Nele o povo se reunia para adorar a Deus. Davi sonhou em construí-lo, mas foi Salomão que concluiu a obra, o que lhe rende grande fama até hoje. O templo era o centro do culto a Deus no Antigo Testamento, mas ao que parece essa visão ainda está presente em muitas igrejas atualmente.

Prova de que a centralidade do templo anda em alta no meio do povo cristão está patente aos olhos de quem contempla as megaconstruções, às vezes sem fim, de igrejas. A justificativa está quase sempre amparada em textos bíblicos do AT. No final das contas, quase todo o dinheiro arrecadado que sobrou das despesas fixas teve como destino a conclusão da obra (do templo, não de Deus).

Poucas heresias têm sido tão bem sucedidas como esta, que se tem disseminado entre as mais diferentes denominações sob o disfarce de glorificação do nome do Senhor, “que é santo, grande e belo, e por isso merece um palácio”, como alguns gostam de dizer. Na verdade, o que está por trás desse anseio que muitos líderes têm por ver suas casas de oração impecavelmente acabadas é a velha e conhecida vaidade, que causou a queda do homem e de Satanás e ainda faz estagnar ministérios limitados às quatro paredes, impecavelmente pintadas, por sinal.

Já perdi as contas de quantas vezes ouvi o mesmo discurso em torno do templo. Campanhas e mais campanhas são feitas para terminar aquela parte ali e começar aquela acolá. A coisa vira uma bola de neve e nunca tem fim. Os crentes se empolgam em torno da mais recente obra eclesiástica inaugurada, dão glórias a Deus e motivam-se ainda mais a contribuir para a conclusão do Palácio para o Rei dos reis.

Enquanto isso, a crise humanitária nas mais longínquas regiões do planeta, ou ali mesmo na esquina, passa despercebida. A seca, a violência urbana e a miséria na favela ao lado são assuntos retóricos, e se o Poder Público não faz, não se deve responsabilizar as igrejas. Fotos de missionários implorando por auxílio financeiro enfeitam as paredes do templo, e ex-drogados, ex-presidiários e ex-doentes são trazidos à baila com seus testemunhos para refrigerar nossas consciências e comprovar que a igreja está fazendo a coisa certa.

O discurso até pode variar, mas a prática é quase sempre a mesma. Algumas moedas para as agências missionárias carentes, um discurso retaliador a obras sociais supostamente ancoradas na Teologia da Libertação e o carnê da construção no bolso, e deste pro gazofilácio. Afinal, Deus é maravilhoso, e merece mármore, granito e, se possível, um santo dos santos como o que está descrito na Bíblia. E não se pode esquecer os bancos confortáveis para os membros fieis (leia-se dizimistas), ambiente climatizado para aumentar o conforto dos filhos da promessa e um púlpito digital para otimizar a mensagem pregada.

Onde é que estamos, Senhor? Que santidade é essa que pregamos que faz do supérfluo prioridade e transforma missionários em pedintes? De que parte do discurso de Jesus aprendemos que tu te importas mais com templos que com vidas? 

Não estou aqui propondo que as igrejas deixem de investir completamente em seus edifícios, nem afirmando que comprar aparelhos de ar condicionado ou bancos acolchoados seja sempre futilidade. Sei muito bem que cada comunidade tem seu contexto e suas necessidades específicas. Estou perguntando a você e a mim mesmo, que somos a Igreja, onde estamos colocando nossos dízimos e ofertas. E presumo que a resposta não seja a mais satisfatória.

Pergunto-me se quando Cristo voltar as paredes dos templos irão encontrar com ele nas alturas juntamente com a Igreja. Acho que não. E tenho cá minhas dúvidas de que se trata de cegueira espiritual. Está mais para leviandade, comodidade e vaidade. E ouso afirmar que a Igreja será rigorosamente cobrada pela forma como tem tratado questões bíblicas urgentes e prioritárias.

“Então dirá também aos que estiverem à sua esquerda: Apartai-vos de mim, malditos, para o fogo eterno, preparado para o diabo e seus anjos; porque tive fome, e não me destes de comer; tive sede, e não me destes de beber; sendo estrangeiro, não me recolhestes; estando nu, não me vestistes; e enfermo, e na prisão, não me visitastes. Então eles também lhe responderão, dizendo: Senhor, quando te vimos com fome, ou com sede, ou estrangeiro, ou nu, ou enfermo, ou na prisão, e não te servimos. Então lhes responderá, dizendo: Em verdade vos digo que, quando a um destes pequeninos o não fizestes, não o fizestes a mim. E irão estes para o tormento eterno, mas os justos para a vida eterna”. Mt 25:41-46

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Sobre o autor: Cristão reformado, formado em administração de empresas e teologia, membro da IPB - Fortaleza/CE.
Artigo enviado por e-mail.
Contatos com o autor: renatocesarmg@hotmail.com

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