Por Clóvis Gonçalves
A posição evangélica dominante nos dias de hoje identifica-se com o teólogo holandês Jacó Armínio, pelo que nos debates teológicos é designada como arminianismo. O que muitos não sabem é que Armínio era bem mais "calvinista" que os arminianos atuais imaginam ou gostariam de saber. Se eles soubessem o que ele escreveu a respeito de alguns assuntos importantes no debate sobre a salvação, poderiam não se tornar calvinistas, mas pelo menos seriam arminianos melhores.
Descobririam, por exemplo:
a) Que ele recomendava a leitura da obra de Calvino
"Depois da leitura das Escrituras..., e mais do que qualquer outra coisa,... eu recomendo a leitura dos Comentários de Calvino ... Pois afirmo que na interpretação das Escrituras Calvino é incomparável, e que seus Comentários são mais valiosos do que qualquer coisa que nos tenha sido legada nos escritos dos pais — tanto assim que atribuo a ele um certo espírito de profecia no qual ele se encontra em uma posição distinta acima de outros, acima da maioria, na verdade, acima de todos." (Carta escrita a Sebastian Egbertsz, publicada em P. van Limborch e C. Hartsoeker, Praestantium ac Eruditorum Virorum Epistolae Ecclesiasticae et Theologicae (Amsterdam, 1704), nº 101).
b) Que ele cria na doutrina da providência
"Nesta definição de Providência Divina, eu de forma alguma a privo de qualquer partícula daquelas propriedades que concordam ou pertencem a ela; mas eu declaro que ela preserva, regula, governa e dirige todas as coisas e que nada no mundo acontece acidentalmente ou por acaso. Além disto, eu coloco em sujeição à Providência Divina tanto o livre-arbítrio quanto até mesmo as ações de uma criatura racional, de modo que nada pode ser feito sem a vontade de Deus, nem mesmo as que são feitas em oposição a ela , somente devemos observar uma distinção entre as boas e as más ações, ao dizer, que "Deus tanto deseja e executa boas ações," quanto que "Ele apenas livremente permite as que são más." Além disto ainda, eu muito prontamente admito, que até mesmo todas as ações, sejam quais forem, relativas ao mal, que possam possivelmente ser imaginadas ou criadas, podem ser atribuídas ao Emprego da Divina Providência, tendo apenas um cuidado, "não concluir deste reconhecimento que Deus seja a causa do pecado." (Works, vol 1: The providence of God)
c) Que ele cria nos decretos divinos
"Os decretos de Deus são os atos extrínsecos de Deus, ainda que sejam internos, e, por essa razão, feitos pelo livre-arbítrio de Deus, sem qualquer necessidade absoluta . Todavia um decreto parece exigir a suposição de outro, a bem de uma certa conveniência de igualdade; como o decreto relativo à criação de uma criatura racional, e o decreto relativo à salvação ou condenação [dessa criatura] sob a condição de obediência ou desobediência. A ação da criatura também, quando considerada por Deus desde a eternidade, pode algumas vezes ser a ocasião, e algumas vezes a causa motriz externa de criar algum decreto; e isto de tal forma que sem tal ação [da criatura] o decreto não seria nem poderia ser feito. (...) Embora todos os decretos de Deus foram feitos desde a eternidade, todavia uma certa ordem de prioridade e posterioridade deve ser formulada, de acordo com sua natureza, e a relação mútua entre elas." (Works, vol 2: On decree of God)
d) Que ele cria na predestinação
"O primeiro na ordem dos decretos divinos não é o da predestinação, pela qual Deus preordenou para fins sobrenaturais, e pela qual ele resolveu salvar e condenar, declarar sua misericórdia e sua justiça punitiva, e ilustrar a glória de sua graça salvadora , e de sua sabedoria e poder que concordam com aquela mais livre graça.(...) Os eleitos não são chamados "vasos de misericórdia" na relação de meios para o fim, mas porque a misericórdia é a única causa motriz, pela qual é feito o próprio decreto da predestinação para salvação." (Works, vol 2: On predestination to salvation)
e) Que ele cria na imperdibilidade da salvação
"Embora eu aqui, aberta e sinceramente, afirmo que eu nunca ensinei que um verdadeiro crente pode, total ou finalmente, abandonar a fé, e perecer; todavia não nego que haja passagens da Escritura que me parecem apresentar este aspecto; e as respostas a elas que tive a oportunidade de ver não se mostraram, em minha opinião, convincentes em todos os pontos. Por outro lado, certas passagens são fornecidas para a doutrina contrária [da perseverança incondicional] que merecem especial consideração." (Works, vol 1: The perseverance of the saints).
De minha parte, ficaria muito feliz se os atuais arminianos firmassem posição com Jacó Armínio. Pois já estaríamos no lucro.
Fonte: Cinco Solas
Nota do blog Bereianos: Esse artigo foi originalmente publicado no blog Cinco Solas pelo irmão Clóvis Gonçalves, em 4/08/2008. Embora seja antigo e de conhecimento de muitos, vale a pena o "review".
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Nota do blog Bereianos: Esse artigo foi originalmente publicado no blog Cinco Solas pelo irmão Clóvis Gonçalves, em 4/08/2008. Embora seja antigo e de conhecimento de muitos, vale a pena o "review".
4 comentários
Irmãos,
ResponderNão foi Calvino e nem Armínio quem morreu na Cruz por nós. Quanto à Soteriologia me considero um Arminianista, porém admiro muito Calvino, e sabe qual a razão? Os dois contribuíram muito com seus estudos sistemáticos. Confesso que cansei de ver cada um (Calvinistas e Arminianistas) tentar puxar a "sardinha" da razão para o seu lado...
Glória a Deus!
ResponderNão sou calvinista, mas também não me identificava totalmente com o arminianismo atual, pois leva o homem ao total controle sobre a salvação. Sou mais adepto as doutrinas de Jonh Wesley. Porém vendo armínio deste ponto vejo que não é sua doutrina em sim que está equivocada e sim aqueles que há interpretam de forma erronea.
Creio na predestinação, mas não na base do "uni dune te", creio na soberania divina e creio na responsabilidade humana.
e) Que ele cria na imperdibilidade da salvação
ResponderEle não cria nisso, ele apenas cria que a segurança da salvação está em Cristo Jesus. Se tal segurança será eterna ou se ela pode ser perdida, ele nunca deu certeza.
A forma calvinista de perseverança dos santos nunca poderia ser afirmada por ele. A questão de Arminius era da forma 'posso cair, mas não vou'.
E a frase citada deixa claro que ele não tinha certeza:
todavia não nego que haja passagens da Escritura que me parecem apresentar este aspecto
Todo "Calvinista" de pé é um "Arminiano". Todo "Arminiano" prostrado é um "Calvinista".
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