.
Depois de ler a obra de Erasmo defendendo a doutrina de livre arbítrio, Martinho Lutero escreveu uma resposta com o título Da Vontade Cativa. Neste volume ele respondeu a Erasmo da seguinte maneira:
Com estas palavras, Lutero afirmou que a coisa essencial que separa os protestantes dos católicos é que a doutrina protestante rejeita a noção do livre arbítrio e os católicos a aceitam. Lutero entendeu a doutrina de livre arbítrio como a base das heresias dos católicos e teria entendido o arminianismo como uma volta em direção a Roma. Neste ensaio nós examinaremos o livre arbítrio como é definido pelos arminianos, e veremos que o estudo das seitas revela que essa doutrina é muitas vezes central nas suas teologias.
A palavra de Lutero acerca do catolicismo pode ser aplicada muito bem à maioria das seitas. Mas se isso for verdade, então, para montar uma apologética suficiente contra as seitas será necessário também refutar essa doutrina chave. Isso significa que, no fim das contas, somente uma apologética plenamente reformada é adequada para conseguir a derrota das teologias e heresias das seitas. Uma apologética comprometida com o arminianismo já concorda com as seitas sobre a questão central da autonomia metafísica do ser humano. Veremos que isso tem implicações graves que inevitavelmente solapam tal apologética. Por outro lado, a apologética reformada é capaz de detonar a base das heresias e mostrar que todas elas levam logicamente ao irracionalismo e, finalmente, o niilismo. Neste trabalho estudaremos o mormonismo como exemplo para demonstrar a eficácia da apologética reformada contra as seitas.
Primeiro é preciso determinar exatamente o que está em jogo. A questão é o relacionamento entre a soberania de Deus e a vontade do ser humano. Nós enfrentamos nesta questão duas visões distintas da natureza humana, e finalmente, da natureza de Deus também. Começaremos com a descrição do livre arbítrio segundo o arminianismo atual.
Clark Pinnock é talvez o defensor do arminianismo mais conhecido atualmente. Ele é um bom representante das correntes do arminianismo porque ele, na sua teologia, trabalha conscientemente para esclarecer e defender as implicações lógicas da teologia arminiana. No seu livro Grace Unlimited (Graça ilimitada), ele define o livre arbítrio como a capacidade original do homem de "escolher entre a obediência de amor e a desobediência da rebeldia, gozando o livre arbítrio no sentido mais pleno, sem nenhuma coerção".(2) Na mesma página ele diz que o homem tem o poder de um desempenho ativo na produção da história e da sua própria vida. O ser humano tem o poder de literalmente criar o futuro do nada.
O significado disso é que os arminianos não estão apenas apoiando o conceito da capacidade do ser humano de escolher livremente segundo os seus desejos, mas ainda limitada pelos parâmetros da sua natureza humana e pecaminosa. A posição arminiana diz que a vontade humana é independente de qualquer predeterminação. Mesmo admitindo a existência de influências, os arminanos fazem questão de dizer que elas não determinam as ações do arbítrio humano. Assim, o arbítrio não é limitado nem pela condição humana, nem pelo conselho eterno de Deus. Ele é indeterminado. Para eles, "livre arbítrio" quer dizer que o arbítrio atua como uma causa sem causa. Ele pode causar eventos, mas as suas escolhas não são o resultado de outros eventos prévios. O ser humano, portanto, tem a capacidade de iniciar na história algo totalmente novo, ou, nas palavras de John Sanders, nossa resposta a Deus é, num sentido real, ex nihilo.(3) O ser humano é um criador tanto como Deus.
Assim, Pinnock pode negar que a vontade de Deus seja sempre cumprida. Ele assevera que ela é algo que pode ser rejeitada e anulada. A história é o palco de uma luta contra Deus e as potestades e o ser humano é um dos lutadores. Deus não está dirigindo os dois lados, mas o lado do mal tem independência metafísica de Deus, e assim, não está sob o controle soberano dos decretos de Deus.(4)
Essa definição breve basta para mostrar que nos bastidores do conceito do livre arbítrio encontrase a noção de um ser indeterminado, que é o pano de fundo dos eventos da história. Em outras palavras, todos os seres, inclusive Deus, são participantes num drama cujos atores geram o roteiro a cada momento, sem nenhuma força que determina previamente qual será o resultado. É um roteiro sem autor, mas sim com muitos autores que estão contribuindo com sua parte, criando, do nada, a história. As escolhas e ações dos atores são indeterminadas, ou seja, não causadas por condições prévias. Cada uma é totalmente livre e autônoma. O palco onde o drama está sendo realizado é o do ser em geral, no qual todos participam, mas que é impessoal, caótico, e indeterminado. Mesmo Deus é sujeito às suas mudanças aleatórias, embora Ele esteja fazendo o melhor que seja possível para assimilar e controlá-lo.
O arminianismo nos apresenta uma criação que não é totalmente criada ainda. Cabe ao ser humano funcionar como co-criador com Deus. Assim, o futuro está totalmente aberto. Isso leva alguns arminianos, como Pinnock, a negar que Deus tem conhecimento do futuro.(5) O que não existe ainda não pode ser conhecido. Se Deus conhecesse o futuro, ele seria determinado e essa necessidade não seria consistente com o livre arbítrio. Para preservar a autonomia do homem é preciso negar a onisciência de Deus, segundo Pinnock.
As implicações e problemas que se seguem dessa visão do livre arbítrio são enormes. Eles são expostos por R. K. McGregor Wright no seu livro A Soberania Banida.(6) Dr. Wright mostra claramente que o arminianismo implica que o universo é controlado por acaso e que isso leva ao irracionalismo e a destruição de qualquer base para a responsabilidade do homem por suas ações. Além disso, o deus dos arminianos é essencialmente finito. Ele é limitado pelo ser em geral, do qual ele faz parte e que é maior que ele. O que nos interesse agora é o fato, também notado por Dr. Wright, de que essa visão de acaso ou caos atrás de tudo é essencialmente a visão pagã do mundo que se encontra nas várias religiões e filosofias não-cristãs. O que elas têm em comum é o desejo de proteger a autonomia metafísica (livre arbítrio) do homem de qualquer intrusão do Deus soberano. Várias das seitas defendem a doutrina do livre arbítrio como o mesmo resultado.
Uma visão radicalmente diferente de Deus, do universo e do homem existe na cosmovisão do calvinismo. Calvino declara nitidamente a posição reformada nas Institutas. As Escrituras, segundo Calvino, negam que as coisas aconteçam por acaso. Embora a razão carnal sempre atribua ao acaso o destino das pessoas, o crente não deve pensar assim. Sejam bons, sejam maus, os eventos são todos governados pelo plano secreto de Deus. A mão de Deus está dirigindo todas as coisas para cumprir os seus propósitos.(7) O Deus onipotente é ativo e está envolvido em tudo o que acontece. Deus não é apenas a causa primária das coisas, o motor imóvel, mas sim o agente que regula todas as coisas de tal maneira que nada acontece sem a sua deliberação. Por causa disso, o crente não tem que temer as estrelas e outros sinais dos céus como os não-crentes temem. Todas essas coisas são governadas pelo plano secreto de Deus de modo que nada aconteça que não é conscientemente e livremente decretado por Deus.(8) A presciência de Deus é compreensiva, mas não é apenas fundamentada no olhar de Deus para o futuro. Deus conhece o futuro porque é ele que determina o futuro. Assim, todos os eventos procedem do plano fixado de Deus e nada acontece por acaso.(9)
O controle de Deus inclui especificamente a vontade do homem. Os homens são sujeitos totalmente à vontade de Deus e nada podem fazer sem o poder de Deus.(10) O ser humano não é autônomo, e a sua vontade não é independente da determinação de Deus. O acaso e o destino são palavras pagãs e o povo de Deus nem deve gastar tempo pensando nelas.(11)
O Deus testemunhado por Calvino e a teologia reformada é radicalmente diferente do Deus dos arminianos. O Deus afirmado pela teologia reformada não faz parte do ambiente ontológico comum com os seres humanos e as demais criaturas. Deus é o seu próprio ambiente porque não existe uma realidade atrás dele ou além dele no qual ele existe. Em hipótese alguma a ontologia bíblica permite que o homem e Deus sejam incluídos juntos num ser geral. Se existisse, tal serseria necessariamente impessoal e mais fundamental na natureza da existência do que o próprio Deus. Deus seria apenas mais um elemento no universo assim como o homem.
O Deus de Calvino e da teologia reformada não existe como só um elemento num ser comum com a criação. Este Deus é o Deus que a Bíblia afirma como o Criador de todo ser além de si mesmo. Pelo poder de sua palavra Deus falou e criou o universo do nada, "pois ele falou, e tudo se fez; ele mandou, e logo tudo apareceu" (Sl. 33.9). Assim, a Bíblia afirma a doutrina da distinção entre o Criador e a criatura. Essa doutrina é um dos pressupostos fundamentais da cosmovisão cristão, sem o qual não existe mais o cristianismo. A negação dessa doutrina e a confusão da criatura com o Criador que se segue dessa negação é a característica básica do pensamento pagão que Paulo condena em Romanos 1.22-25.
Enquanto a ontologia arminiana postula que Deus e o homem são igualmente participantes num ser impessoal geral, que seria necessariamente superior e independente dos dois, a ontologia bíblica, afirmada pelo calvinismo, diz que Deus é o Ser original, independente, derradeiro, e altamente pessoal, que livremente criou o ser e o universo. Este ser, com "s" minúsculo, é totalmente dependente do decreto criativo de Deus. A história dos eventos deste ser é também criada e dependente no decreto de Deus. Portanto, toda ação criativa do ser humano e todas as suas escolhas, são derivadas e dependentes do decreto de Deus também.
Deus é a causa primária do universo, pois ele o criou. O decreto de Deus não apenas deu origem ao universo como tal, mas também estabeleceu a realidade da causalidade entre todos os eventos da história, ou seja, a causalidade secundária.(12) Portanto, os eventos que acontecem não são indeterminados e não acontecem por acaso, como a teoria de livre arbítrio implica. Eles são determinados pela causalidade natural que vincula cada acontecimento, e, finalmente pelo plano de Deus. Quando uma bola de bilhar bate numa outra, o movimento da segunda é causada pela força da primeira, mas tudo dentro do controle soberano de Deus.
As escolhas das pessoas também fazem parte da causalidade secundária. Elas são determinadas pelos eventos anteriores e determinam eventos posteriores. As decisões e ações do ser humano são assim incluídas na causalidade natural que é, finalmente governada pelo plano de Deus. Portanto, as ações das pessoas também não acontecem por acaso.
Mas, isso quer dizer que a pessoa é uma máquina ou robô programado? Uma escolha determinada é significativa? Essas são indagações importantes e a teologia reformada tem resposta adequada. A resposta é encontrada na idéia de livre agência. O agente livre não age fora do conselho determinado por Deus, mas a vontade não é sujeito a uma coerção contra seus desejos. Ela é livre para deliberar e determinar qual caminho é que ela vai seguir segundo seu próprio querer, personalidade, e caráter, no contexto das influências sociais e espirituais que existe na sua vida. As escolhas que ela faz têm significado porque são elos na cadeia de causalidade que vinculam todos os eventos que acontecem. Essas escolhas funcionam como causas reais e concretas dos eventos, circunstâncias e resultados que se seguem delas. As escolhas do agente livre são causadas pelo caráter e os desejos da própria pessoa. Destarte, as personalidades das pessoas participam plenamente na operação da vontade.
No universo dos arminianos isso seria impossível. Num universo indeterminado não poderia existir uma cadeia de causalidade. Cada acontecimento seria um evento independente, sem vinculo com os outros. As escolhas das pessoas, sendo eventos, também seriam indeterminados e sem vinculo com outros eventos. Escolhas indeterminadas não podem determinar nem outros eventos nem as subseqüentes escolhas das pessoas num universo onde tudo é indeterminado. O livre arbítrio significa a negação da responsabilidade e da coerência da personalidade humana. Mas no universo dos calvinistas, o decreto soberano de Deus estabelece e sustenta a livre agência do homem e o significado de toda a sua atividade.
O contraste entre o universo dos arminianos e o dos calvinistas não pode ser mais distinto. De um lado nós temos um ser impessoal que abrange tudo, Deus incluído, numa teia de contingência ou acaso puro. Deus é assim limitado e o homem é deixado boiando num mar de acaso puro que nem ele, nem Deus podem dominar. Do outro lado, nós temos o Deus Trino independente que completamente só constitui o Ser original, pessoal e não criado. Segundo seu plano e decreto ele fez e mantém todas as coisas com todas as suas relações umas com as outras, dando significado a cada fato. Essa criação, na sua totalidade, coisas e eventos, matéria e energia, espaço e tempo, é um ser dependente e distinto de Deus, que encontra o seu propósito em cumprir o plano de Deus pela glória de Deus.
II. Livre Arbítrio e as Seitas
A
distinção entre a teoria do livre arbítrio, segundo o arminianismo, e a
livre agência, segundo o calvinismo, revela que a questão em jogo é a
distinção entre duas cosmovisões diferentes. Com essa distinção em
mente, podemos voltar à tese principal deste trabalho, a saber, que a
teoria do livre arbítrio segundo arminianismo é basicamente igual da
teoria de livre arbítrio que se encontra nas seitas. Assim, existe um
pano de fundo ontológico comum entre o arminianismo e as seitas, que
está ausente na Bíblia. Portanto, qualquer apologética fundamentada em
princípios arminianos será inadequada para confrontar as seitas. É
preciso uma apologética conscientemente reformada, alicerçada na
soberania de Deus. Essa tese será demonstrada primeiro através de
observações da doutrina de livre arbítrio em várias seitas, e depois,
uma exposição mais profunda das conseqüências da doutrina de livre
arbítrio na teologia dos mórmons. Primeiro, é preciso demonstrar como a
doutrina arminiana é parecida à das seitas.
No
livro, Reasoning From Scripture, as Testemunhas de Jeová declaram que
Deus não predestina os eventos da história. Deus não decretou a queda de
Adão. Ele nem previu que a queda aconteceria.(13)
Citando Ecl. 9:11 a Torre de Vigília ensina que muitas coisas acontecem
puramente por acaso. Esses eventos são desconhecidos de antemão.(14)
Jeová, segundo a Torre de Vigia, pode desligar seu conhecimento do
futuro. Ele é capaz de conhecer os eventos, mas opta por se limitar a
somente poucos eventos, para não violar o livre arbítrio dos seres
humanos.(15)
Deus pode conhecer ao futuro mais ele também pode não o conhecer.(16) Ele não predestina alguns a salvação e outros para a reprovação, mas sim respeita o livre arbítrio de cada um. (17)
É
óbvio que, quanto a questão do livre arbítrio, a doutrina das
Testamunhas de Jeová é igual à dos arminianos. Entretanto, as TJ's não
têm o receio de admitir que logicamente isso limita a presciência de
Deus, enquanto a maioria dos arminianos prefere ignorar este ponto e
continuar crendo que Deus conhece o futuro. Pinnock, ao rejeitar a
presciência de Deus, nitidamente se coloca no lado das TJ's. Ele mostra
que, logicamente, o paralelo entre o ontologia dos arminianos e o das
TJ's permanece intacto.
Albert
Pike fala sobre a noção do livre arbítrio na maçonaria. O livre
arbítrio é representado pelo símbolo de Satanás, que não é um ser
pessoal. Disse ele: "para os iniciados, isso (Satanás) não é uma pessoa,
mas uma força, criado para o bem, mas que podia servir para o mal. Ele é
o instrumento da liberdade ou o livre arbítrio."(18) A maçonaria, sendo uma religião gnóstica, também coloca Deus num ser comum com o homem.
O
Reverendo Sun Myung Moon, da Igreja de Unificação, ensina que há um
sincretismo entre a ação de Deus a ação do homem para cumprir o
propósito de Deus. O homem não depende totalmente de Deus para alcançar a
perfeição, mas ele depende no seu próprio desempenho.(19)
O ser comum, compartilhado por Deus e as criaturas, na teologia de
Moon, é mais pronunciado do que no caso dos arminianos, porque Deus,
segundo Moon, gerou as criaturas do seu próprio ser. Mas mesmo assim, a
noção de autonomia é igual.
L.
Ron Hubbard, o fundador da Cientologia, também defendeu o livre
arbítrio do seu livro, Dianetics. Segundo Hubbard, o homem é organismo
auto-determinado. Se ele não fosse assim, ele seria reduzido ao nível de
animal.(20) Por
isso, ele precisa da terapia oferecida pela Igreja de Cientologia.
Somente isso pode livrá-lo das influências externas que limitam o livre
arbítrio.
A
Ciência da Mente, um precursor do Movimento da Nova Era, ensina o
panteísmo e a divinidade de todas as pessoas. Esta seita acredita que "o
homem deve ser criado com a possibilidade de liberdade ilimitada e
deixado em paz para descobrir a si mesmo".(21) Se
ele sofrer, não é por causa de algum decreto divino, mas simplesmente
por que ele violou a Lei da Realidade na sua ignorância.(22) Essa cosmovisão põe o ser humano entre a liberdade absoluta de um lado e um destino impessoal e rígido no outro lado.
Nestas
breves citações nós temos uma amostra das idéias sobre o livre arbítrio
que se encontram nas seitas. Apesar de algumas diferenças, a noção da
autonomia metafísica do homem de qualquer causalidade anterior é um
elemento comum. Podemos ampliar a lista com outras seitas, mas isso não é
necessário para sustentar o argumento. Devemos refletir sobre o fato de
que o calvinismo é declarado o inimigo tanto pelas seitas quanto pelos
arminianos. Será que isso é acidente? Qual poderia ser a fonte dessa
declaração comum? Devemos refletir nisso enquanto continuamos nosso
estudo. Faremos isso através de um exame mais profundo de mais uma seita
que também defende o livre arbítrio, a saber, o mormonismo.
III. A Cosmovisão dos Mórmons
Segundo o autor mórmon, LeGrande Richards,
As escrituras sagradas não sustentam a posição extrema de muitos do tipo de pensamento: (1)
que alguns são predestinadas a vida eterna é apesar de suas ações, eles
a alcançarão, enquanto outros são predestinados à reprovação eterna, e
se predestinados assim, não podem fazer coisa alguma sobre isso.(23)
É
claro que Richards deturpou a doutrina da predestinação, mas é
igualmente claro que ele negou qualquer predestinação divina. O líder
mórmon, Bruce McConkie, escreveu que a "agência é a capacidade de
escolher o bem ou o mal. Ela é um princípio eterno que existira com Deus
desde toda eternidade".(24) Essa agência é o poder de escolha.(25)
McConkie não permite nenhuma dúvida quanto à oposição da doutrina da
agência segundo mormonismo, ao calvinismo. As igrejas que ensinam que os
homens são predestinados a receber a salvação ou maldição, segundo a
eleição de Deus, não encontram nenhum lugar na sua teologia de agência.
Seu raciocínio é assim: por que há a necessidade da agência, para ser
capaz de fazer boas obras que levam à salvação, se a salvação é
determinada pela Divinidade na base da predestinação apesar das obras?
Portanto, segundo McConkie, a "falsa" doutrina da predestinação dá luz à
falsa doutrina que os homens não são livres para efetuar a sua própria
salvação, como é feito possível pelo sacrifício expiatório de Cristo.(26)
Assim, a noção do livre arbítrio, ou a autonomia do homem de Deus, é
defendida de forma semelhante a dos arminianos. A presença desta
doutrina na teologia mórmon é central para seu conceito de Deus, homem,
salvação e o universo.
A. Deus e Homem
Joseph
Smith estabeleceu os parâmetros da doutrina de Deus que ainda prevalece
entre os mórmons no seu King Follet Discourse (Discurso do Rei Follet).
Ele disse que "o próprio Deus foi uma vez como nós somos agora, e é um
homem exaltado, e assenta no trono lá nos céus! Isso é o grande segredo.
Se o véu fosse rasgado hoje, e o grande Deus que segura este mundo na
sua órbita, e que sustenta todos os mundos e todas as coisas por seu
poder, fosse se tornar visível, - eu digo, se vocês vissem-no hoje,
vocês o viriam na forma de homem - igual a vocês na pessoa, imagem, e
mesmo a forma de homem." (27)
Obviamente,
a implicação lógica dessa noção é que Deus é um ser finito. Sterling
McMurrin, filósofo mórmon, explica a natureza do Deus dos mórmons no seu
livro The Theological Foundations of the Mormon Religion (O alicerce
teológico da religião mórmon). Segundo McMurrin, os mórmons descrevem
Deus com "linguagem não-absoluta como um ser condicionado por e
relacionado ao mundo do qual ele faz parte e que, desde que ele [o
mundo] não é, no fim das contas, a sua criação, não é completamente sob o
seu domínio".(28)
Este Deus não é o criador nem dos elementos fundamentais do universo nem
do espaço e tempo. Ele é mais parecido com o demiurgo de Platão. Ele é
um artesão que trabalha com a matéria crua do universo para dar-lhe
forma. Deus existe no ambiente do universo físico, junto com os demais
seres e mentes. Os princípios que estruturam o universo fazem parte
deste ambiente. McMurrin afirma que é um artigo fundamental da teologia
dos mórmons que Deus se relaciona com um ambiente mundial do qual ele
não é o alicerce e pelo que ele mesmo é condicionado. Deus é somente um
ser entre outros seres, não a origem de todo ser, e assim ele é finito
em vez de ser absoluto.(29)
A
distinção entre o Criador e a criação é negada pela doutrina de Deus do
mormonismo. McMurrin nota que isso é muito parecido com a posição do
naturalismo filosófico, como se encontra na filosofia dos gregos antigos
e dos humanistas de hoje.(30)
A existência do universo não é atribuída ao ato criativo de Deus. O
universo apenas existe; ponto final. Deus não é a totalidade do ser
original e não é a fonte derradeira de todo ser. McMurrin corretamente
diz que isso é um desvio radical do teísmo tradicional, seja teísmo
cristão, judaico ou islâmico. Portanto, há uma negação fundamental da
distinção entre o sobrenatural e o natural na teologia mórmon. Deus é
apenas mais um ser natural entre todos os outros porque tudo que existe é
o universo natural. Não existe nenhuma ordem divina que é distinta da
ordem física da experiência normal. Deus existe no tempo e espaço. Não
existe substância imaterial. Deus tem um corpo tanto quanto o homem.(31)
Ontologicamente,
Deus e homem existem como seres finitos numa realidade, um ambiente
ontológico, comum. A distinção entre os dois pode ser descrita mais como
uma distinção quantitativa do que qualitativa. A limitação de Deus ao
universo temporal quer dizer que Deus está em processo, como todos os
seres conscientes. Diz McMurrin:
Deus
é colocado, portanto, nem por cima nem por fora, mais por dentro do
processo continuo do universo. A imutabilidade da realidade é assim
negada, e a história mundial, a historia humana, o desempenho humano, as
coisas que os seres humanos conseguiram, e a liberdade humana, ganham
um significado novo, porque o futuro é real e único, não apenas da
perspectiva do homem, mas também da ótica de Deus.(32)
Dessa
visão da realidade, irrestivelmente se segue à noção da "grande cadeia
do ser", que diz todo ser está evoluindo através de uma escala de
existência para as regiões mais altas. O conceito da "grande cadeia do
ser" é a tentativa pagã de resolver o problema do Um e do Múltiplo (o Um
e os Muitos).(33)
Este problema lida com a necessidade de descrever a relação entre a
diversidade de coisas que existem e a unidade aparente atrás de todas as
coisas. Por exemplo, existem muitos cachorros, mas o que é o conceito
comum de "cachorro" que serve para unificar todos eles numa classe só de
animais? O que é último, a unidade ou a diversidade? Sendo sem
resposta, a mente não-cristã resolve a tensão entre a unidade absoluta,
que absorve e destrói a individualidade, e a diversidade absoluta, que
reduz tudo a entidades caóticas e sem vinculo umas com as outras,
através da criação desta cadeia. A diversidade - e o caos do não-ser -
fica em baixo, e a unidade - o ser perfeito - fica por cima. Todas as
coisas têm seus lugares como elos na cadeia, com as mais perfeitas, que
participam no ser absoluto, nos lugares superiores.
A
cadeia é também vista como uma escada cujos vários níveis levam os
seres cada vez mais perto da divindade. Todas as criaturas têm seus
lugares na escada que começa no caos do não-ser e ascende para a unidade
do ser absoluto. Este conceito, que vem do ocultismo, valoriza os seres
mais altos, e, geralmente, as várias religiões pagãs incluem algum
mecanismo cujo propósito é levar as criaturas e entidades caídas de
volta para cima. No hinduismo e espiritismo o mecanismo é a
reencarnação. No catolicismo romano é o sistema sacramental. No
mormonismo é a progressão eterno, que é o plano de salvação dos mórmons.
O
homem, segundo mormonismo, foi colocado na terra para progredir de seu
estado inferior até ele se tornar um ser divino, um deus. Isso foi o que
o Deus fez. O homem é um filho espiritual de Deus, mas mesmo isso
significa apenas que a atividade criativa de Deus somente organizou e
deu forma à essência individual de cada ser humano nesta terra. Essa
essência essencial existia sempre e segundo mormonismo, é, como McMurrin
relata, não-criada, não-derivada e sem início. Neste esquema, a
diversidade é a realidade ulterior (como a unidade é no hinduismo). A
realidade é vista como uma pluralidade de particulares indeterminados.(34)
Destarte, o universo é contingente, ou indetermindado, e o futuro está
aberto, sendo um mistério tanto para Deus quanto para o homem.
B. O problema do mal
Os
mórmons asseveram que a sua teologia resolve o problema do mal porque
seu Deus não pode ser acusado de o ter criado. A liberdade (livre
arbítrio) é uma propriedade da pessoa não-criada e a probabilidade da
existência do mal moral faz parte da estrutura original das coisas.(35)
Deus enfrenta o mal como um fato do universo, e a natureza divina luta
contra ele. Segundo Joseph Smith, o mal moral é uma das existências
eternas tanto como espaço e tempo.(36) O
bem moral também existe independente de Deus. O bem e o mal existem
como duas realidades iguais segundo o Livro de Mórmon, porque na
natureza do universo há a necessidade de uma oposição em todas as coisas
(2 Nefi 2:11-17). McMurrin mostra que isso não significa apenas que o
mal existe para possibilitar o bem, mas, e isso é uma idéia muito mais
forte, que o mal deve existir simplesmente porque ele existe
inevitavelmente. McMurrin é certo ao afirmar, que a noção da existência
do mal assim desenvolvida no Livro de Mórmon é inconciliável com a
doutrina de criação ex nihilo como na teologia de Agostinho.(37)
Obviamente a visão dos mórmons tem muito mais em comum com o
maniqueísmo que Agostinho abandonou e refutou do que a doutrina de
criação que ele defendeu e que se encontra na teologia reformada também.
C. Mormonismo e Arminianismo
Nós
vimos nas citações acima que os mórmons defendem a noção de autonomia, o
livre arbítrio, igual ao conceito arminiano. 2 Nefi:2, no Livro de
Mórmon, desenvolve as implicações do livre arbítrio na teologia dos
mórmons. O argumento começa com o dualismo ético e afirma que a queda do
homem no pecado foi na verdade uma coisa boa, desde que o homem carecia
do conhecimento do bem e do mal que ele precisava para atingir a sua
divindade. No fim, o argumento chega ao clímax com a afirmação da glória
da autonomia humana. McMurrin explica que isso é uma rebelião contra a
doutrina do pecado original, e que o homem, na teologia dos mórmons, não
sofre de uma natureza pecaminosa.(38) O Livro de Mórmon, segundo McMurrin, reflete a reação arminiana contra calvinismo - e contra qualquer forma de predestinação!(39) O livre arbítrio é supremo e deve ser defendido em tudo.
O
livre arbítrio afirmado pelo mormonismo é o poder pleno de escolhas
contrárias, no mesmo sentido que é defendido por Pinnock. Essa visão é
exatamente igual ao conceito arminiano e subentende uma visão metafísica
que é similar também. É somente por falta de consistência lógica que os
arminianos não vão tão longe no seu desvio da ortodoxia cristã como os
mórmons. O mórmon admite que a sua posição em prol do livre arbítrio
destrói completamente a distinção entre o Criador e a criação enquanto o
arminiano tenta ignorar essa dificuldade óbvia.
Não
deve ser uma surpresa que o arminianismo, no fim das contas, não pode
refutar o mormonismo com êxito. Eles têm pressupostos comuns acerca da
autonomia do ser humano. Nos dois sistemas Deus enfrenta um mistério
último que dá cabo de sua onisciência e presciência (apesar das
reclamações de alguns arminianos ao contrário). Existe uma área de ser
sobre o qual tanto Deus quanto o homem não podem conhecer coisa alguma.
Existe a possibilidade que algum fator ainda desconhecido possa surgir e
acabar com o plano de Deus. Algum fato ainda não descoberto poderia
demonstrar que todo nosso conhecimento e o conhecimento de Deus seja
falso. Assim, o alicerce da revelação na Bíblia está em dúvida. Como é
que o arminiano pode argumentar que a revelação que ele recebeu na
Bíblia é superior ao Livro de Mórmon quando nem todos os fatos são
conhecidos e nunca serão? O domínio do ser desconhecido pode romper e
destruir todo que nós achamos que é verdadeiro hoje. O empirismo da
apologética arminiano, e também o próprio arminanismo devem ser
abandonados o mais rápido possível!
IV. Uma resposta Reformada
O
esboço de uma resposta reformada mostra que somente uma apologética
alicerçada na soberania de Deus, como é apresentada na teologia da
reforma, é capaz de refutar as heresias do mormonismo. O argumento
depende das obras de Cornelius Van Til e Gordon H. Clark, dois dos três
apologetas mais importantes do século 20 (o terceiro é o batista Carl F.
H. Henry - Van Til e Clark eram presbiterianos). Ficará nítido que
somente uma filosofia enraizada no Deus Trino da Bíblia cujos decretos
controlam tudo que há de acontecer pode defender a fé cristã e erguer
uma cosmovisão adequada.
O
método é a argumentação através dos pressupostos. Isso quer dizer,
indicar os pressupostos que formam a base metafísica e epistemológica da
sua cosmovisão e demonstrar que estes pressupostos, e somente estes,
podem sustentar uma interpretação do universo que não termina no
irracionalismo. O argumento revela os pressupostos da posição não-cristã
e mostra que ela acaba destruindo a possibilidade de conhecimento e
qualquer interpretação racional da realidade.
A. Deus e homem
O
conceito reformado de Deus afirma que Deus é absoluto. Os seus
atributos são atributos de um ser infinto. O significado disso é que nem
o ser de Deus, nem o plano de Deus são condicionados por qualquer coisa
fora do próprio Deus. Deus é eterno porque ele transcende o tempo e é
onipresente porque ele transcende o espaço, embora ele esteja presente
em todo lugar no espaço. O conhecimento de Deus é auto-referêncial. O
seu conhecimento não é derivado de uma outra fonte, fora de Deus, mas é
original com Deus.(40)
Ele não conhece o futuro porque ele olhou para frente e o assistiu como
se fosse um vídeo. Ele conhece o futuro porque ele conhece os seu plano
original e exaustivo e determinou o futuro segundo este plano.
Van
Til também explica que Deus é personalidade absoluta. Os atributos de
Deus não são abstratos, mas refletem a atividade moral de Deus. Não
existe nenhum princípio de verdade, do bem, ou da beleza ao lado de Deus
ou por cima de Deus segundo cujo padrão ele fez ou organizou o mundo.
Os princípios de verdade, bem e beleza são idênticos com a essência de
Deus e essa essência é puramente pessoal. Nós somos pessoas também, mas
pessoas somente num sentido finito. Há uma distinção qualitativa, não
apenas quantitativa entre nós e Deus.(41)
A
personalidade de Deus implica a doutrina da pluralidade de pessoas no
único ser de Deus. As três pessoas são "co-substanciais" ou seja,
nenhuma é derivada das outras. A unidade e a diversidade são igualmente
originais. Isso é um ponto importante para resolver as dificuldades que
os arminianos e mórmons não conseguiram resolver. Como Van Til nota,
"para nós tudo depende por seu significado neste tipo de Deus". (42)
Mais
um pressuposto essencial na fé reformada é a distinção entre o Criador e
a criação. Como foi descrito acima, a Bíblia defende uma distinção
absoluta entre a criação e o Deus criador. O Deus Criador é o Ser
original, não-criado, eterno, absoluto, etc. Ele criou o ser dependente
do universo, que é distinto da sua própria essência. A fé reformada nega
que existe um ser geral que abrange Deus e a criação juntos. Deus não
existe no ambiente de um universo maior que ele, que inclui os outros
seres também. Deus conhece seu próprio Ser completamente e também o ser
do universo que ele criou. Para ele, não há mistério, nem no seu Ser,
nem na criação.
O
Deus finito dos mórmons supostamente revela várias informações através
das escrituras dos mórmons e dos profetas. Tais revelações são
necessariamente limitadas às porções do universo que este Deus finito já
pesquisou, conquistou e está manipulando. Existem áreas vastas no
espaço que ainda têm de ser organizados por outros deuses. Portanto, as
revelações de mormonismo são nada mais do que as interpretações de seres
finitos de um universo que é finalmente um mistério. A sua essência
nunca pode ser penetrada por seres finitos porque isso exigiria um
conhecimento verdadeiramente exaustivo de todos os fatos, passados,
presentes e futuros. Para os deuses dos mórmons, muito sempre
permanecerá desconhecido. Logicamente, o mórmon não tem garantia nenhuma
contra a possibilidade de que em algum lugar distante no universo ainda
não conhecido serão encontrados outros deuses, mais poderosos, que não
concordam com o plano dos mórmons, e que derrotarão os deuses dos
mórmons e botarão todos eles, com os próprios mórmons, no lago de fogo
eterno. McMurrin nota que alguns teólogos mórmons reconhecem o problema,
mas escondem este fato atrás de linguagem absoluta. Os mórmons
freqüentemente falam de Deus como se fosse eterno, infinito e absoluto,
mais isso é realmente somente relativo à condição do ser humano.(43)
Obviamente,
tal "deus" não pode garantir a segurança do futuro de ninguém. O uso da
linguagem absoluta é ou um engano, ou desonestidade, mas de forma
alguma representa a verdade. Mas essa linguagem serve para apagar o medo
do mórmon típico, que nunca ousa fazer perguntas desta natureza sobre a
sua fé. Logicamente, a mesma conclusão é aplicável ao arminianismo,
quando levado à sua conclusão lógica. Somente um Deus que controla tudo
que acontece, o Deus absoluto, pode garantir que não existem outros
poderes no universo, maiores que ele mesmo. Somente um Deus que é a
origem de todo conhecimento e que não enfrenta mistério no universo pode
dar uma revelação infalível e inerrante. E somente se existe tal
revelação, conhecimento de qualquer tipo é possível. Embora o homem
enfrente mistério no universo, ele pode ter conhecimento verdadeiro e
confiável porque ele recebeu a revelação inerrante de Deus na Bíblia.
Esta revelação serve como a base epistemológica de todo conhecimento
humano.
B. O Problema do mal
A
reivindicação de que o mormonismo resolve o problema do mal não tem
base ao examinar os fatos. O problema principal é que, no fim das
contas, a cosmovisão do mormonismo não dá base nenhuma para distinguir
entre o bem e o mal. O bem e o mal se tornam conceitos arbitrários. Os
mórmons dizem que o bem e o mal são conceitos absolutos que existem na
natureza. Mas eles também dizem que não existem substâncias imateriais.
Isso significa que, em algum sentido, o bem e o mal devem ser
substâncias materiais. Mas isso é absurdo. O bem e o mal são idéias, e
como tal, não podem existir a não ser que nas mentes de seres pessoais.
Agora,
se não existisse nenhuma mente absoluta, distinta e soberana sobre toda
a criação, então os conceitos do bem e do mal só existiriam em mentes
igualmente finitas. Tais mentes seriam igualmente condicionadas pelas
forças impessoais, irracionais, e matérias do ser em geral do universo
que seria o ambiente comum dessas mentes. Em outras palavras, as idéias
de um ser finito não podem ter prioridade sobre os outros seres finitos.
Todas são iguais. Assim, no universo dos mórmons, cada ser teria sua
própria idéia sobre o bem e o mal, e todo discurso sobre ética seria
apenas uma questão das opiniões das várias mentes finitas. Então, o que
uma pessoa (ou um deus) acha que é o bem pode ser o que uma outra acha
que é o mal. Não haveria tribunal de apelação superior. No fim, a
vontade do ente mais avançado e poderoso venceria. Assim, a situação
fica pior ainda para o mórmon, porque não é que ele apenas não pode
saber se o deus dele pode manter seu poder no futuro e não ser derrotado
por algum inimigo, mas o mórmon nem sabe se seu deus é certo ou não! O
conceito do bem no mormonismo é puramente arbitrário. Se não estivessem
os mórmons levando emprestado os valores bíblicos que eles herdaram da
reforma eles não poderiam ter qualquer ética.
Gordon
Clark demonstrou que a resposta do problema do mal é que simplesmente
não há ser superior a Deus. Por isso não há padrão do bem e mal que é
além de Deus. O padrão é o caráter de Deus como é expressado nos seus
decretos. Se Deus faz algo, então, isso é, por definição, certo. Não há
lugar para o homem pode julgar Deus.(44)
Conclusão
O
mórmon se considera um ser livre e capaz de interpretar a realidade sem
referência ao Deus Trino que determina tudo. Nesta visão, ele obtém o
conhecimento através de meios empíricos, enquanto ele e os seus deuses
trabalham para superar o domínio do mistério ulterior do universo. A
salvação vem através do trabalho e mérito do indivíduo autônomo. É assim
que o homem se torna deus. Mas, para ter essa autonomia, ele paga um
preço muito alto. Porque, no fim, ele não pode confiar na sua salvação e
ele nunca sabe se as suas obras são suficientes ou se uma força o fator
não previsto vai arruinar tudo.
O
conceito de autonomia metafísica, o livre arbítrio, é responsável pela
bagunça epistemológica e ética demonstrada aqui. O mormonismo pressupõe
um universo impessoal e materialístico que produz um deus finito, cego
quanto ao futuro e a essência das coisas, e incapaz de se proteger
contra o caos do misterioso mar do ser que é seu ambiente comum com o
homem. Ele é um deus fraco que não é digno de louvor ou da imitação dos
seres humanos. O conceito mórmon de deus é exatamente o contrário do que
a Bíblia ensina. Mas, logicamente, é muito parecido com o arminianismo.
O
arminianismo é inadequado para refutar os mórmons, porque ele sofre de
muitos dos mesmos defeitos. Existendo num ser comum com o homem, igual
ao deus mórmon, o dos arminanos também é limitado pela sua criação.
Logicamente, o arminano não pode afirmar que a Bíblia é superior ao
Livro do Mórmon porque os dois são revelações de deuses limitados pela
autonomia do ser humano, e o ser geral que eles não criaram. Os
arminianos não têm resposta à limitação do conhecimento de Deus porque
seu Deus é circundado pelo mistério tanto quanto o deus dos mórmons. A
epistemologia arminiana, em fim, acaba no mesmo lugar da epistemologia
mórmon.
Os
arminanios também não conseguem propor uma solução ao problema do mal
que é superior à dos mórmons. O Deus arminiano, logicamente, não é o ser
derradeiro. O ambiente comum, entre Deus e homem, é o ser impessoal do
universo. Os princípios do bem e do mal, se viessem de Deus, seriam
apenas a opinião de um ser que não é o ser ulterior. Mas se ele não
fosse o ser ulterior, porque a opinião dele deve ser o referencial
final? Porque não a opinião de um outro ser que também não é derradeiro?
A ética em tal sistema seria relativa. Como é que uma ética última e
absoluta, como nós encontramos na Bíblia, pode ser derivada de um ser
que não é o ser última?
Finalmente,
um Deus, como o de Pinnock, que não conhece o futuro, também não pode
evitar a possibilidade de uma derrota futura nas mãos de um ser agora
desconhecido que seja mais poderoso. Um ser finito não tem como garantir
que ele é a força maior no universo. Para onde vão, então, as promessas
de Deus e a confiança do cristão na sua salvação? Em qual sentido é
isso superior à situação no qual os mórmons se encontram?
Em
cada instância, a apologética reformada tem as únicas respostas a essas
dificuldades. A apologética reformada começa a partir do Deus soberano,
absoluto e último da teologia reformada como é ensinada na Bíblia.
Desde que ele tem todo conhecimento e poder sobre a criação, ele não
sofre das limitações que enfraquecem a teologia arminana e a teologia
dos mórmons. Assim, o crente pode confiar que há uma solução ao problema
do mal e que Deus nunca será derrotado por outras forças no universo. O
crente calvinista tem boas novas de verdade para o mórmon que está
procurando um Deus maior que pode lhe dá esperança e segurança.
Agradecemos ao Deus verdadeiro que o "deus" dos mórmons não existe e que
o Deus verdadeiro não é como tentam afirmar os arminianos.
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O autor é Bacharel em Artes (Psicologia e História) pela Vanderbilt
University; Mestre em Divindade pelo Denver Seminary e Ph.D. em Estudos
Teológicos e Religiosos pela University of Denver/ Iliff School of
Theology em Denver, Colorado. Professor de teologia na Faculdade
Teológica Batista de São Paulo desde 2001, tendo lecionado a mesma
matéria no Seminário Teológico Batista do Sul do Brasil no Rio de
Janeiro (1996-2001). Também atuou como professor visitante na área de
Filosofia da Religião no Centro Presbiteriano de Pós-Graduação Andrew
Jumper, na Universidade Presbiteriana Mackenzie, São Paulo. Desde 1995 é
missionário no Brasil pela International Mission Board of the Southern
Baptist Convention, E.U.A.
NOTAS
(1)
Martinho Lutero. Da Vontade Cativa. em Martinho Lutero: obras
selecionados, Vol. 4: Debates e Controvérsias, II. Trad. por Luis H.
Dreher, Luis M. Sander, e Ilson Kayes, Comissão Interluterana de
Literatura, org. (São Leopoldo: Editora Sinodal e Porta Alegre:
Concórdia Editora, 1993), XV:215.
(2)
Clark Pinnock, Grace Unlimited (Minneapolis: Bethany Fellowship, 1975),
98. Veja também o capítulo de Pinnock em Predestinação e Livre
Arbítrio. David Basinger e Randall Basinger, orgs., (São Paulo: Mundo
Cristão, 1989).
(3)
John E. Sanders, "God as Personal", em The Grace of God and the Will of
Man, Clark Pinnock, org. (Grand Rapids: Zondervan, 1989), 176.
(4) Pinnock, Grace Unlimited, 101.
(5)
Veja The Openness of God (Downers Grove: Inter Varsity Press, 1994).
Neste livro Pinnock e outras fazem uma nova definição de Deus que nega
ousadamente a presciência de Deus de todos os eventos do futuro.
(6) Soberania Banida: redenção para a cultura pós-moderna (SP: Editora Cultura Cristã, 1998).
(7) João Calvino, As Institutas da Religião Cristã, I.xvi.2.
(8) Ibid. , I.xvi.3.
(9) Ibid. , I.xvi.4.
(10) Ibid., I.xvi.6.
(11) Ibid., I.xvi.8.
(12) Veja a Confissão de Westminster capítulo 5.
(13) Reasoning from the Scriptures (Brooklyn: Watchtower Bible and Tract Society, 1985), 142.
(14) Ibid., 139.
(15) Ibid., 141.
(16) Aid to Bible Understanding (Brooklyn: Watchtower Bible and Tract Society, 1971), 596.
(17) Ibid.
(18) Albert Pike, Morals and Dogma: ancient and accepted rite (Washington, DC: House of the Temple, 1950), 102.
(19) Sun Myung Moon (The Divine Principle, New York: Unification Church, 1973), 55.
(20) L. Ron Hubbard, Dianetics (Los Angeles: American Saint Hill, 1950), 229.
(21) Holmes, Science of Mind (New York: Dodd, Meade and Company, 1963), 109.
(22) Ibid.
(23) LeGrand Richards, A Marvelous Work and a Wonder (Salt Lake City: Deseret Books, 1953), 340.
(24) Bruce McConkie, Mormon Doctrine (Salt Lake City: Bookcraft, 1966), 26.
(25) Ibid.
(26) Ibid., 28.
(27) Joseph Smith, "King Follet Discourse", History of the Church: period 1. Vol. 6. (Salt Lake City: Deseret Books), 305.
(28) Sterling McMurrin, The Theological Foundations of the Mormon Religion, Salt Lake City: University of Utah Press, 1965., 29.
(29) Ibid.
(30) Ibid., 2.
(31) Ibid., 2-3.
(32) Ibid., 39.
(33)
O problema do Um e o Múltiplo é um dos problemas principais da
filosofia que cada cosmovisão tem de resolver. O problema surge no
pensamento não-cristão logo no início porque o Deus Trino não é a base
da cosmovisão nãocristão. O leitor encontrará uma discussão do problema
em Norman Geisler e Paul Feinberg, Introdução à Filosofia: uma
perspectiva cristã (São Paulo: Edições Vida Nova, 1983). Infelizmente, o
tomismo de Geisler impede que ele resolva corretamente o problema. O Um
e o Múltiplo, e também a Grande Cadeia do Ser são tratados, a partir de
uma perspectiva reformada, por R. K. McGregor Wright em Soberania
Banida, capítulo quatro.
(34) McMurrin, The Theological Foundations of the Mormon Religion , 49-50.
(35) Ibid., 99.
(36) Ibid., 108.
(37) Ibid., 97-98.
(38) McMurrin, The Theological Foundations of the Mormon Religion, 66-67, 71-72.
(39) Ibid., 77-78, 81.
(40) Cornelius Van Til, The Defense of the Faith (2nd ed. Phillipsburg, NJ: Presbyterian and Reformed Publishing Co., 1967), 11.
(41) Ibid., 12.
(42) Ibid., 13.
(43) McMurrin, 106-107.
(44) Gordon H. Clark, Religion, Reason, and Revelation (Nutley, NJ: The Craig Press, 1978), 232-233.
Fonte: mensagem de correio eletrônico.