Série Credo Apostólico - Parte 9: A Remissão dos Pecados

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INTRODUÇÃO

“Creio... na remissão dos pecados”

A mensagem de Cristo é boa nova por nos comunicar que somos perdoados por Deus. Mas, a grande questão é: porque precisamos ser perdoados?

Precisamos receber perdão porque somos transgressores da Lei de Deus. Nosso estado de rebeldia teve inicio quando Adão e Eva decaíram do estado de graça, desobedecendo uma ordem expressa do SENHOR. Depois da Queda, a humanidade continuou sendo a imagem de Deus, só que manchada pelo pecado. Como uma folha em branco que depois de amassada ela continua branca, só que toda amarrotada, perdeu sua originalidade, a sua beleza. Em Tiago 3.9 diz sobre a imagem de Deus, e o “Homem” ali no grego é anthropos que quer mostrar que toda a humanidade – logo, toda a humanidade tem a imagem de Deus só que manchada pelo pecado.

Quando obtemos o perdão pelos nossos pecados, isso é uma preciosa dádiva, pois, não éramos bons ou amáveis aos olhos do Pai, ao invés disso, nosso estado era de depravação total: Ef 2:3; Rm 3:12; Jo 8:34. Nossa consciência estava cativa aos desejos carnais. Vivíamos acorrentados pelos prazeres mundanos e não dávamos um passo sequer na direção de Deus. Estávamos imundos e nos sujávamos ainda mais.

O objetivo deste texto é demonstrar a preciosidade da remissão de nossa pecaminosidade.

SOMOS TODOS DEPRAVADOS

Na era do politicamente correto, falar que o homem é pecador soa agressivo e ofende os ouvidos sensíveis de uma geração mimada e que tem “fé em si mesma”. Mas devemos ser bíblicos e demonstrar que ninguém é bom. Como diz o texto sagrado: Não há um justo sequer (Rm 3:12).

A teologia reformada cunhou o termo Depravação Total para expressar o miserável estado de pecaminosidade. Todo homem caído é depravado desde o nascimento, e o termo total não quer dizer que ele chegou ao limite desta depravação, acreditem, o poço da iniquidade é bem fundo. A totalidade desta depravação é ensinada pelo apóstolo Paulo em sua, digamos, antropologia.

Paulo utilizou sete termos para descrever os aspectos do homem natural/decaído, são eles: alma (psychç); espírito (pneuma); carne (sarx); corpo (sôma); coração (kardia); mente (nous); e consciência (syneidçsis). Veremos abaixo a forma pela qual o pecado afeta cada uma dessas partes, fazendo com que o ser humano, em sua totalidade, seja depravado ao ponto de ser controlado pela intensa e vibrante vontade de pecar.

- Alma (psych): este é o termo antropológico menos citado por Paulo; existem 13 menções, apenas. Quando usado, psych refere-se à vida humana. Em Romanos 2:9, Paulo vincula a alma humana à prática do mal. No entanto, isto não quer dizer que a alma humana seja má em si mesma, mas, por fazer parte do ser humano, está diretamente envolvida na condição geral pecaminosa do homem. Já em 1 Coríntios 2.14, o termo psychikos (material, natural) é utilizado como referência ao homem não regenerado, contrastando com pneumáticos (espiritual).

- Espírito (pneuma): embora seu uso mais comum seja referente ao Espírito Santo, pneuma, na teologia paulina, também é parte inerente ao ser humano. Quando, em 1 Coríntios 2:11, o apóstolo fala no “espírito do homem”, fica difícil de aceitar que o homem recebe o pneuma após a conversão. Mais coerente, é considerar que o pneuma está desativado pela degeneração, e quem o reativa é o Espírito de Deus, no processo de conversão/regeneração. Assim, podemos entender pneuma como sendo a mais elevada representação da natureza humana. Por si mesma, essa natureza não é boa nem má; ela torna-se boa ou má através da influência dominante. Sendo assim, o cristão regenerado tem a natureza sob influência do Espírito Santo, tornando-se, por fim, bom. Em contrapartida, o não regenerado continua escravo do pecado, sendo mal em sua essência depravada.

- Coração (kardia): Paulo utiliza kardia para descrever o local onde nasce a concupiscência dos homens e sua insensatez (Romanos 1:21 e 24). Não é o coração que é insensato, é o homem, com a sua degeneração moral, que o faz proceder deste modo. Para Paulo, em alguns casos, o coração é o centro das emoções, e, em outros, significa a pessoa, em sua totalidade. Ele dirá, ainda, que é no coração que recebemos a iluminação para enxergarmos, através de Cristo, a glória de Deus (2 Coríntios 2:6 e Efésios 1:18).

- Mente (nous): este termo é sempre associado, nos escritos paulinos, ao homem. Diferentemente dos gregos, que faziam separação entre a mente e o restante do corpo como se ela fosse uma faculdade especial. Paulo utiliza nous de acordo com a tradição hebraica, abrangendo o homem como um todo, sem destacar o intelecto das demais partes. Novamente, nous não é boa e nem má em si mesma; seu posicionamento moral vai sofrer a influência do que for predominante – a carne ou o Espírito Santo. No caso dos crentes, suas mentes não são mais vis e cegas como a dos incrédulos (2 Coríntios 4:4), mas, sim, iluminadas e renovadas (Romanos 12:2 e 2 Coríntios 4:6).

- Consciência (syneidçsis): esta palavra pode ser definida como o conhecimento de uma ação acompanhado de uma reflexão. É uma palavra que apresenta o homem como um ser racional. A consciência sabe o que é certo. Todo homem, então, é extremamente ciente de seus atos. Em 1 Timóteo 4:2, Paulo fala da consciência “cauterizada” entre aqueles que são enganados pelos que ensinam doutrina de demônios. O fato de o homem saber o que é certo e não fazê-lo explicita a sua natureza degenerada.

- Carne (sarx): este é o termo mais empregado pelo apóstolo Paulo, e, também, o mais variado em seu sentido. Contudo, queremos frisar apenas o conceito antropológico, que remonta à fraqueza humana, devido à sua natureza terrena. Sarx e pecado estão ligados na teologia paulina ao ponto de o apóstolo a definir como fonte dos maus desejos (Gálatas 5:16). Indo mais além, a carne é uma produtora de pecados; e, em Gálatas 5:19, temos ideia dos seus produtos. Num contexto não cristão, sarx é predominante e conduz à morte (Romanos 7:5).

- Corpo (soma): finalizamos essa análise da antropologia paulina com soma. Aqui, deve-se fazer distinção entre corpo e carne. Sarx não sofre transformação; o corpo, sim, sendo liberto em Cristo da sua influência carnal. Este é o sentido da santificação na vida do cristão. A finalidade de soma é ser morada do Espírito Santo (1 Coríntios 6:19). A mudança de um corpo carnal para um corpo glorificado é progressiva, do mesmo modo que ocorre com a mente. Todavia, o corpo daquele que não for regenerado por Cristo será destinado à morte. Como está escrito: “Quem me livrará do corpo desta morte?” (Romanos 7:24). Por conseguinte, segundo Paulo, o homem natural não é espiritual. Essa é uma deficiência que só pode ser suprida pelo poder e atuação do Espírito Santo. Não há nada em nenhuma das epístolas paulinas - ou em algum outro ensino bíblico -, que destoe da DT.

PERDÃO VISÍVEL

Ao nos depararmos com esta realidade, passamos a valorizar mais a remissão dos pecados. Até porque ela nos foi oferecida gratuitamente. Não pagamos o preço, mas Cristo sim. Na cruz do calvário, Ele despachou de uma vez por todas o nosso estado de pecaminosidade e rasgou nossa dívida para com o nosso Criador.

“Quando vocês estavam mortos em pecados e na incircuncisão da sua carne, Deus os vivificou juntamente com Cristo. Ele nos perdoou todas as transgressões, e cancelou a escrita de dívida, que consistia em ordenanças, e que nos era contrária. Ele a removeu, pregando-a na cruz”. - Colossenses 2:13,14

Louvado seja Deus, pois por mérito do Cordeiro pascoal nós fomos reconciliados consigo. Ao nos contemplar, Deus nos enxerga lavados e remidos pelo sangue de seu Filho. Isto é uma realidade na qual todos os crentes que compõem a comunhão dos santos vivenciam. Este perdão é real. Devemos com júbilo repetir as palavras de Paulo aos crentes de Roma: “Portanto, agora já não há condenação para os que estão em Cristo Jesus” (Rm 8.1).

Sempre que a Igreja se reúne, este perdão é celebrado. Devemos então lembrar, que agora temos acesso ao trono da graça e fazer de cada culto uma festa solene, em louvor ao nosso amável Remidor. Além disto, Deus nos deixou dois meios de graça, que são os sacramentos da Ceia e do Batismo, para nos servir como sinais visíveis de nossa redenção. O Batismo, que é o rito de entrada para a Igreja nos comunica que somos lavados, e assim, nosso velho homem morre para que o novo reine por meio do Santo Espírito que habita em nós. Já a Ceia nos faz lembrar do sacrifício que nos conferiu a remissão de nossos pecados.

Ainda sobre os sacramentos, eles não são simples memoriais, vão além disso, nos auxiliando em nossa fé, nutrindo as nossas almas com a presença espiritual de Cristo e nos dando a vívida imagem do perdão que alcançamos pela bendita graça que vem de Deus.

CONCLUSÃO

Mesmo a nossa carne ainda prevalecendo em alguns momentos, devemos ter a noção de que nada muda o nosso status – adquirido por Cristo – perante o SENHOR. Na cruz, nossos pecados passados, presentes e futuros foram remidos. Todavia, isso não quer dizer que não necessitamos de constante confissão.

Nós não confessamos nossos pecados por medo de perder a salvação, pois não a conquistamos por nós mesmos. A confissão é resultado de uma pessoa que está em processo de santificação, e que reconhece, ao pecar contra Deus, que precisa estar em Sua dependência para vencer as tentações e vivenciar uma vida santa em gratidão a Cristo, para o louvor de Sua glória.

O Catecismo de Heidelberg (resposta a questão 56) elucida bem a questão. É com ele que finalizamos:

“Creio que Deus, por causa da satisfação em Cristo, jamais quer lembrar-se de meus pecados e de minha natureza pecaminosa, que devo combater durante toda a minha vida. Mas Ele me dá a justiça de Cristo pela graça, e assim nunca mais serei condenado por Deus”.

Soli Deo Gloria

***
Autor: Pr. Thiago Oliveira
Divulgação: Bereianos


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