Não
somente o livre arbítrio é incapaz de livrar Deus da culpabilidade, e a
permissão é incapaz de coexistir com a onipotência, mas o posicionamento
arminiano também não consegue firmar uma posição lógica para o onisciência. Uma
ilustração romantista-arminiana é a do observador posicionado num penhasco. Na
estrada abaixo, à esquerda do observador, um carro dirige-se para o oeste. À
direita do observador, um carro vindo do sul. Ele pode ver e saber que haverá
uma colisão no cruzamento logo abaixo dele, mas a sua presciência, segundo reza
o argumento, não causa o acidente. Deus, semelhantemente supõe-se, tem
conhecimento do futuro sem, entretanto, causá-lo.
Tal
semelhança, porém, é enganosa em vários pontos. O observador humano não pode
saber realmente se a colisão ocorrerá. Embora seja improvável, é possível que
ambos os carros estourem os pneus antes de chegarem ao cruzamento e se desviem.
Também é possível que o observador tenha calculado mal as velocidades, e um
carro poderia desacelerar e o outro acelerar, de modo a não colidirem. O
observador humano, portanto, não tem presciência infalível. Nenhum
desses erros pode ser assumido para Deus. O observador humano pode imaginar a
possibilidade de ocorrência do acidente, e tal imaginação não torna o acidente
inevitável; mas se Deus sabe, não há a possibilidade de evitar o acidente. Cem
anos antes que os motoristas nascessem, não havia a possibilidade de evitar.
Não haveria a possibilidade de um dos dois decidir e ficar em casa nesse dia,
tomar uma rota diferente, dirigir numa velocidade diferente. Eles não poderiam
tomar decisões diferentes das que tomaram. Isso significa que eles não tinham
livre arbítrio ou que Deus não sabia.
Suponha-se,
só por um instante, que a presciência divina, assim como as predições humanas,
não cause o evento conhecido de antemão. Ainda assim, se existe a presciência,
em contraste com a predição falível, o livre arbítrio é impossível. Se o homem
tem livre arbítrio e as coisas podem ser diferentes, Deus não pode ser
onisciente. Alguns arminianos têm admitido isso e negado a onisciência, mas
isso, obviamente, antagoniza-os com o cristianismo bíblico. Há também outra
dificuldade. Se o arminiano ou o romantista pretende preservar a onisciência
divina e ao mesmo tempo alegar que a presciência não tem eficácia causal, ele
deve explicar como a colisão foi assegurada cem anos antes, na eternidade,
antes que os motoristas tivessem nascido. Se Deus não organizou o universo
dessa maneira, quem o organizou?
Se
Deus não o organizou dessa forma, então deve existir um fator independente no
universo. E se houver tal, decorrem uma ou duas consequências. Primeira, a
doutrina da criação deve ser abandonada. Uma criação ex nihilo estaria completamente no controle de Deus. Forças
independentes não podem ser forças criadas, e forças criadas não podem ser
independentes. Então, segunda, se o
universo não é criação de Deus, o conhecimento que Deus tem dele – passado e
futuro – não pode depender daquilo que ele pretende fazer, mas da sua
observação do modo como funciona. Nesse caso, como teríamos a certeza de que as
observações de Deus são acuradas? Como teríamos certeza que essas forças
independentes não mostrarão mais tarde uma torcedura insuspeita que falsificará
as predições de Deus? E, finalmente, nessa perspectiva, o conhecimento de Deus seria
empírico e não parte integral da sua onisciência, e, portanto, ele seria um
conhecedor dependente. Podemos crer consistentemente na criação, onipotência, onisciência
e nos decretos divinos, mas não podemos permanecer em sanidade e combinar
alguma dessas doutrinas com o livre arbítrio.
***
.
Postar um comentário
Política de moderação de comentários:
1 - Poste somente o necessário. Se quiser colocar estudos, artigos ou textos grandes, mande para nós por e-mail: bereianos@hotmail.com
2 - A legislação brasileira prevê a possibilidade de se responsabilizar o blogueiro pelo conteúdo do blog, inclusive quanto a comentários; portanto, o autor deste blog reserva a si o direito de não publicar comentários que firam a lei, a ética ou quaisquer outros princípios da boa convivência. Comentários com conteúdo ofensivo não serão publicados, pois debatemos idéias, não pessoas. Discordar não é problema, visto que na maioria das vezes redunda em edificação e aprendizado. Contudo, discorde com educação e respeito.
3 - Comentários de "anônimos" não serão necessariamente postados. Procure sempre colocar seu nome no final de seus comentários (caso não tenha uma conta Google com o seu nome) para que seja garantido o seu direito democrático neste blog. Lembre-se: você é responsável direto pelo que escreve.
4 - A aprovação de seu comentário seguirá os nossos critérios. O Blog Bereianos tem por objetivo à edificação e instrução. Comentários que não seguirem as regras acima e estiver fora do contexto do blog, não serão publicados.
Para mais informações, clique aqui!
Blog Bereianos!