Por Leonardo Dâmaso
O ato profético é uma espécie de
ritual ou prática que faz parte do sistema doutrinário e litúrgico de muitas
igrejas/seitas, especificamente as neopentecostais e pentecostais, onde as
quais adotaram tal sistema como uma influência mesclada do judaísmo do AT e
suas implicações simbólicas [ainda que inconsciente ou por ignorância por parte
dos pastores e cristãos] das religiões afro trazidas pelos africanos para o
Brasil, pelo espiritismo, pelas artes mágicas e pelo o ocultismo em geral.
Todavia, o meu objetivo neste artigo não é analisar as várias passagens no AT e
nem os elementos utilizados como uma espécie de “ato profético ou fé no
trabalho que é feito” nas religiões pagãs que descrevi. Limitei-me apenas no
texto de Atos 19.11-12 por falta de espaço e porque este é o principal texto
utilizado pelos adeptos como base para o ato profético. Desse modo, vejamos este texto [dentre tantos no AT] utilizado como respaldo para tal
prática pelos adeptos e defensores do ato profético, a saber – Atos 19.11-12.
Atos 19.11-12 – "E Deus,
pelas mãos de Paulo, fazia milagres extraordinários, a ponto de levarem aos
enfermos lenços e aventais do seu uso pessoal, diante dos quais as enfermidades
fugiam das suas vítimas, e os espíritos malignos se retiravam." ARA
No texto a lume, Lucas relata ou não
que os lenços e aventais de Paulo quando eram colocados sobre os doentes eles eram
curados? Claro que sim! Entretanto, precisamos entender primeiro todo o
contexto desta passagem e de outros livros ou cartas do AT e NT que abordam
este assunto, ainda que implicitamente para chegarmos à conclusão correta.
Não obstante, o lugar no qual ocorreu
este fato, ou seja – das pessoas pegarem os lenços e aventais de Paulo para colocar
sobre os doentes foi na cidade de Éfeso, onde Paulo empreendeu sua terceira
viagem missionária (At 19), permanecendo lá cerca de três anos (AT 19.31). Se
analisarmos meticulosamente todo contexto da cidade de Éfeso e o contexto em
geral das Escrituras, conforme salientei acima, iremos perceber que Éfeso era
uma cidade mística e supersticiosa, onde imperava a idolatria e o culto a Diana
dos Efésios (At 19.24-28; 18-19).
Havia um templo nesta cidade onde
esta falsa divindade era cultuada. Contudo, doravante ao misticismo que
predominava em Éfeso, muitos ali, ainda não cristãos e até alguns que já haviam
se convertido ao evangelho de Cristo Jesus através da pregação de (Priscila e
Àquila, possíveis fundadores da igreja de Éfeso), não tinham quase conhecimento
algum da Escritura. Estes novos convertidos eram pessoas leigas e incautas em
relação às Escrituras, os quais tomavam os lenços e aventais de Paulo e colocavam
sobre os enfermos, onde, mesmo assim [por ignorância], Deus curou várias
pessoas conforme é descrito em (At 19.11-12). Paulo amarrava os lenços ao redor da cabeça e costumava usar os aventais na cintura quando fabricava tendas.
Por outro lado, embora Deus tenha
curado inúmeras pessoas através dos lenços e aventais de Paulo, conforme é
mencionado no capítulo 19 de Atos, em todo o Novo Testamento não
encontramos nenhuma permissão ou ordem de nenhum apóstolo ou até do próprio
Senhor Jesus nos evangelhos “ensinando ou orientando a prática de atos
proféticos”. Podemos procurar que sequer vamos encontrar uma passagem sobre
isto! Deus, em Atos 19 fazia maravilhas pelas mãos de Paulo, porém, ELE
PERMITIU PELA SUA MISERICÓRDIA QUE AS PESSOAS FOSSEM CURADAS PELOS LENÇOS E AVENTAIS DO
APÓSTOLO assim como a sombra de Pedro curava (At 5.15).
Desse
modo, os lenços e aventais de Paulo foram um canal do poder de Deus manifestado
em sua vida bem como na vida de Pedro [que através de sua sombra pessoas foram
curadas] e dos demais apóstolos. Porém, é deveras importante compreendermos o
significado de outros objetos além dos pedaços das roupas de Paulo com poderes
miraculosos utilizados por Deus no AT e NT para evitarmos interpretações
equivocadas e heréticas. Dentre estes objetos temos o cajado de Moisés (Êx 8.5,
16), o manto de Elias (2Rs 2.8, 14) e as vestes de Jesus que tinha o poder de
curar quem as tocasse, onde não somente a mulher do fluxo de sangue fora curada
quando as tocou pela fé, mas também outras pessoas doentes foram curadas ao
tocar nelas (veja Mt 14.36; Mc 6.56; Lc 6.19). Augustus Nicodemus escreve
que
O
propósito das narrativas acerca do poder que havia neles [nos objetos descritos acima] foi
mostrar o extraordinário poder de Deus na vida dos seus possuidores,
comprovando que a sua mensagem vinha realmente da parte de Deus. O ponto é que
esse poder era tão grande que até as coisas com as quais Moisés e Elias
tinham contato diário se tornavam canais através dos quais ele era
transmitido. [...] Devemos entender, entretanto, qual o objetivo dessas
narrativas. Em todas elas, o conceito é o mesmo. Jesus e os apóstolos eram tão
cheios do poder de Deus que as coisas com as quais tinham contato íntimo se
tornavam como que em extensões deles, para curar e abençoar as pessoas. O
objetivo é idêntico: enfatizar a enormidade do poder de Deus na vida deles e,
assim, atestar que a mensagem pregada por eles, bem como pelos profetas do
Antigo Testamento, vinha de Deus. A prova eram os poderes miraculosos tão
extraordinários que até mesmo vestes, bordões, ossos, saliva, sombra e lenços
desses homens transmitiam o poder curador de Deus que neles havia. É dessa
maneira que devemos entender o relato de Atos 19 sobre o poder curador dos
lenços e aventais de Paulo.1
Em
contrapartida, é importante entendermos que Paulo não distribuiu e sequer orou
"consagrando" os seus lenços e aventais para que estes fossem entregues ao
povo em uma forma mística como vemos hoje nas igrejas neopentecostais, que
consagram os mais variados tipos de objetos como um tipo de amuleto ou talismã
que possui poderes sobrenaturais, os quais são apenas um símbolo para a prática da fé ou são ativados pela fé do adepto, dizem alguns. Justo
González corrobora que
A referência
aos lenços e aventais de Paulo forneceram uma oportunidade para que alguns
supostos evangelistas fizessem dinheiro com a venda deles e de outros itens que
tinha abençoado. Contudo, observe que aqui, o texto não sugere que Paulo
distribuiu ou proclamou o poder de seus lenços e aventais, mas, antes, que as
pessoas os pegavam sem o conhecimento do apóstolo. Não é, como alguns declaram
hoje, que Paulo abençoou lenços para que pudessem ser realizados milagres por
intermédio destes.2
Portanto,
Deus não leva em conta os equívocos cometidos por muitos cristãos sinceros e
nascidos de novo no início da conversão em pregações e no serviço prestado a
Ele por falta de maturidade e conhecimento das Escrituras. Contudo, em toda a
passagem de Atos 19 Deus “não diz que devemos fazer isto hoje ou que ele
aprovava tal atitude dos Efésios”. Os sinais e prodígios operados pelos
apóstolos e por outros cristãos que não eram apóstolos, como Estevão, por
exemplo, eram necessários nesta época “singular” em que o Cristianismo estava
sendo expandido às nações para:
1 Apontar para a pessoa de Cristo como o filho de Deus, Deus e a sua obra
redentora (Mc 2.1-12; At 2.1-38; 3.1-26). 2 Atestar que a mensagem que o
apóstolo anunciava e o próprio apóstolo vinha da parte de Deus (At 2.14-41;
5.12-16; 10.34-48). 3 Fortalecer a fé dos cristãos (Jo 20.30-31; At 14.1-3).
Em
suma, os profetas, na história de Israel no Antigo Testamento, e os apóstolos,
na história de Israel e de lugares fora de Israel que foram evangelizados por
Paulo foram pessoas usadas por Deus de forma única e extraordinária para um
propósito específico que se cumpriu neles historicamente. Nenhum cristão hoje é
usado por Deus da mesma forma que estes homens do passado foram. Pedaços de
roupas ou qualquer outro objeto de nosso uso pessoal não vai transmitir cura
para as pessoas. Deus não vai, tampouco, assim como os profetas e os apóstolos
que escreveram cartas, livros e evangelhos, usar alguém hoje para escrever
novas revelações porque o cânon das Escrituras está fechado com todas as
revelações necessárias para a igreja. Deus usa hoje, os cristãos, pregadores e
pastores de outra forma que difere da maneira que usou os profetas e apóstolos.
Deus não muda em sua natureza, porém, ele muda a sua maneira de agir
providencialmente na história.
John Stott atesta que
A atitude mais sábia perante os milagres dos lenços não é a dos céticos, que os declaram espúrios; nem a dos imitadores, que tentam copiá-los, como aqueles televangelistas que oferecem aos doentes lenços abençoados por eles, mas sim a dos estudiosos da Bíblia que lembram que Paulo via seus milagres como credenciais apostólicas e que Jesus mesmo foi condescendente com a fé tímida da mulher, curando-a quando ela tocou a orla de sua roupa.3
John Stott atesta que
A atitude mais sábia perante os milagres dos lenços não é a dos céticos, que os declaram espúrios; nem a dos imitadores, que tentam copiá-los, como aqueles televangelistas que oferecem aos doentes lenços abençoados por eles, mas sim a dos estudiosos da Bíblia que lembram que Paulo via seus milagres como credenciais apostólicas e que Jesus mesmo foi condescendente com a fé tímida da mulher, curando-a quando ela tocou a orla de sua roupa.3
Diante
de tudo o que vimos, entendemos pelas Escrituras que os lenços e aventais
de Paulo foram usados por Deus para o propósito de cura somente em Éfeso no
período em que o apóstolo esteve lá por três anos evangelizando. Por outro
lado, "nas igrejas de libertação, os objetos são ungidos, abençoados,
fluidificados e consagrados por meio da oração e da imposição de mãos dos
pastores e obreiros, depois do que passam supostamente ter poderes especiais.
No entanto, em nenhum dos casos mencionados nas Escrituras, os objetos empregados
nos milagres passaram, antes, por uma cerimônia de consagração. A Bíblia
desconhece totalmente a "unção" das coisas com o fim de serem
empregadas em atos miraculosos, para atrair a benção de Deus, ou ainda, para
expelir demônios e doenças. É verdade que no Antigo Testamento alguns objetos,
utensílios e mobília do tabernáculo e, depois, do templo foram ungidos com
sangue e óleo. Porém, o propósito não era investir essas coisas de poderes
especiais, e sim separá-las do seu uso comum para o uso
sagrado nos rituais de sacrifício".4
Finalmente,
os Efésios eram pessoas místicas, supersticiosas, idólatras e pessoas sem um entendimento claro ou com pouco conhecimento das Escrituras, nesse caso, os novos
convertidos. Sendo assim, não devemos imitar ou adotar o ato profético hoje
como uma norma ou sistema doutrinário para igreja. Não há apoio em toda a
Escritura para isto!
NOTAS:
1 Augustus Nicodemus Lopes. O que você precisa saber
sobre Batalha Espiritual, pág 148-149.
2 Justo González. Atos,
pág 265.
3 John Stott. A
Mensagem de Atos, pág 344.
4 Augustus
Nicodemus Lopes. O que você precisa saber sobre Batalha Espiritual, pág
150-151.
***
Fonte: Bereianos
.
3 comentários
Excelente e correta análise exegética e hermenêutica. Deus abençoe cada vez mais. Antonio Francisco
Responderparabens consegui fazer minha mae ter um pouco mais de coomprendimento e crer na graça
ResponderExcelente espricação, hoje o esoterismo esta dominando as igrejas pentecostais e neopentecostais, são lenço ungido, oleó ungido, papel higiênico ungido, caneta ungida, vassoura ungida e todos os tipos de porcaria que estão (dando) nas igrejas; Aliás dando não vendendo, e estão tirando a fé das pessoas do nosso Salvador Jesus Cristo e colocando nessa porcarias idólatras
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