Objeções ao conceito da Cessação da Revelação – Parte I

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“A palavra final” de Deus a seu povo encontra-se em Jesus Cristo e nas explanações inspiradas de sua pessoa e obra como reservadas nas Escrituras do antigo e do novo pacto. Enquanto a maioria dos cristãos professos se sente muito à vontade, confessando a singularidade da pessoa de Jesus Cristo, muitos encontram dificuldade para aceitar o conceito de que não se deve esperar qualquer outra revelação como orientação para suas vidas além daquela que se encontra na Escritura. As objeções à idéia da cessação da revelação emanam de uma série de considerações.

1. Objeções Bíblicas

A primeira objeção à idéia de um fim da função dos dons revelacionais, hoje, surge da percepção de que essa asseveração diretamente contradiz às exigências bíblicas específicas. O apóstolo Paulo declara: “Não desprezeis as profecias” (1Ts 5.20). Ainda mais intencionalmente, ele declara: “Não proibais o falar em línguas” (1Co 14.39). Quem presumiria pôr-se contra as ordenações inspiradas de Deus e afirmar às pessoas que não podem nem profetizar nem falar em línguas?

Com toda certeza, nenhuma pessoa que afirma a autoridade da Bíblia teria a audácia de opor-se a qualquer ordenação bíblica. Certamente que não faria sentido resistir a mandamentos especificamente bíblicos, quando a intenção é afirmar que as Escrituras contêm em si mesmas a plenitude e a finalidade da revelação divina. Mas a questão não é se a profecia e as línguas seriam proibidas pelos homens. Ao contrário, a questão é se a profecia e as línguas foram levadas à sua plenitude e ao seu objetivo final pelo plano e propósito de Deus.

É um fato que não se pode negar que algumas ordenações divinas se limitaram ao povo de Deus para uma era particular, senão que subseqüentemente foram revisadas, modificadas ou mesmo canceladas. Obviamente, muitos mandamentos dados no Velho Testamento não mais obrigam o povo de Deus de hoje. A despeito da clara proibição bíblica, é plenamente correto cozer um cabritinho no leite de sua mãe. Uma pessoa que vive na época do novo pacto não é contaminada por comer carne de porco ou ostras. Esses preceitos, ainda que claramente divinos em sua origem, não mais determinam o estilo de vida do povo de Deus.

O mesmo princípio é válido para alguns mandamentos na era do novo pacto. Fases e estágios no desenvolvimento do novo pacto podem não ser tão dramaticamente diferentes uns dos outros como no caso dos períodos do antigo pacto. Todavia, é evidente que as diferenças existem. Em certo momento, Jesus enviou seus discípulos e lhes disse que não levassem consigo nenhuma provisão (Lc 10.4). Mais tarde lhes comunicou virtualmente instruções contrárias (cf. Lc 22.36). Num estágio, ele explicitamente os proíbe de irem aos gentios; devem limitar-se “às ovelhas perdidas da casa de Israel” (Mt 10.6). Mais tarde, porém, ele lhes ordena que fossem por todo o mundo e fizessem discípulos de todas as nações (Mt 28.19). Em decorrência da decisão no concílio de Jerusalém, foi comunicada a palavra proibindo a todas as igrejas que deixassem que seus membros comessem animais que uma vez haviam sido estrangulados e contaminados pelos ídolos (At 15.20). Mais tarde, porém, Paulo declara que Deus criou todos os alimentos puros, e que oferecer uma peça de carne a um ídolo não tem efeito algum sobre sua função nutritiva, a não ser que o irmão mais fraco seja conduzido a pecar (1Co 8.4,9).

Mais estreitamente relacionado com o presente tema está a cessação do ofício de apóstolo na igreja. Não há nada na escritura que explicitamente indique que o apostolado teria chegado ao fim. Todavia, geralmente se reconhece que ninguém na igreja hoje aja com a autoridade dos apóstolos originais, visto que ninguém, hoje, seja testemunha ocular da ressurreição de nosso Senhor (At 1.21-22).

Se se reconhecer que o ofício apostólico encerrou-se, então deve-se reconhecer a possibilidade de que o ofício fundamental de profeta também haja cessado de funcionar na igreja atual. Este ofício, além de tudo, é mencionado como segundo em prioridade somente para a posição do apóstolo (1Co 12.28). Além do mais, o ofício de profeta, ao longo dos tempos, serviu como o principal veículo através do qual as matérias revelacionais foram comunicadas ao povo de Deus. Desde a instituição do ofício profético, nos dias de Moisés, Deus falava regularmente aos pais pelos lábios dos profetas (Hb 1.1). Se os ofícios de apóstolo e profeta porventura chegaram ao seu término na igreja de hoje, seria natural concluir que os pronunciamentos revelacionais dos profetas e apóstolos também hajam cessado. Nenhum pronunciamento corrente insinuando autoridade apostólica imprime direção à igreja. Da mesma maneira, seria natural esperar que, com o fim do ofício profético, as palavras revelacionais entregues pelos profetas também chegassem ao fim.

Com respeito às línguas, obviamente seria errôneo proibir uma pessoa de falar em línguas, caso o fenômeno moderno realmente corresponda às mesmas línguas do Novo Testamento. Não importa o choque que causasse numa igreja de nível tradicional, seria injustificável a exclusão desse dom do serviço público de adoração, caso as línguas de hoje fossem as mesmas línguas do Novo Testamento. A clara intenção da admoestação de Paulo visa a anular todo e qualquer esforço de excluir o exercício de um legítimo dom do Espírito no seio do povo de Deus.

Em contrapartida, porém, se as línguas de hoje não são as mesmas línguas do Novo Testamento, então é evidente que uma pessoa não estaria a violentar uma ordenação de Paulo caso se recusasse a permitir alguém de falar no culto de adoração de um modo que estivesse a falar algo que não corresponda às “línguas” do Novo Testamento. Os elementos próprios para se cultuar a Deus devem estar limitados por aqueles exercícios recomendados em sua Palavra, já que os homens não têm nenhum direito de inventar seu próprio modo de aproximar-se do Todo-poderoso. Se as línguas de hoje não correspondem às línguas recomendadas por Paulo, então seria plenamente justo excluí-las do serviço de culto.

Essas ordenanças bíblicas de não se desprezar a profecia e tampouco excluir as línguas só se aplicam às circunstâncias do culto de hoje, caso as “línguas” e a profecia modernas sejam idênticas aos dons do Espírito como funcionaram nos dias dos apóstolos. Se o fenômeno corrente não corresponde aos dons do Novo Testamento, então seria plenamente procedente proibir seu exercício no culto do povo de Deus.

O. Palmer Robertson
Em: A Palavra Final - Resposta Bíblica à Questão das Línguas e Profecias Hoje, Ed. Os Puritanos, pág. 86-89.

Via: [ Eleitos de Deus ]

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