No dia 10 de fevereiro de 2017, foi lançado o segundo filme da trilogia Cinquenta Tons de Cinza que começou a ser cinematografada há dois anos. A sequência chegou aos cinemas com o título de Cinquenta Tons mais Escuros e promete continuar explorando a proposta do uso do domínio e da violência nas relações sexuais. Os livros que deram origem à produção cinematográfica já haviam se tornado um prodígio de publicações e vendas. O fenômeno contabiliza mais de 100 mil cópias vendidas e traduzidas para 52 línguas.[1] Mas agora, com o lançamento dos filmes, o conteúdo dessa trilogia alcançará inúmeras outras pessoas que não tiveram acesso ao material escrito.
Tragicamente, muitas pessoas defendem que o conteúdo de Cinquenta Tons é apenas literatura fictícia, romântica e inofensiva. A internet está repleta de relatos defendendo esse material, sendo que alguns são escritos por mulheres, inclusive adolescentes. Não seria nenhuma surpresa encontrar dentre os autores, algumas pessoas que frequentam a igreja e professam a fé cristã! Mas, sejamos honestos, a única razão pela qual os livros e filmes se tornaram populares são as cenas de sexo e a proposta de um relacionamento sexual mais “picante”! A questão a ser levantada, porém, é se a proposta desse material é, de fato, tão inocente quanto se pensa.
Antes de continuar, preciso deixar claro que não li nenhum livro da série nem assisti a qualquer dos filmes. Isso pode, certamente, levar alguns a pensar que não estou autorizado a escrever sobre o assunto e muito menos oferecer uma análise crítica sobre esse material. Tudo que tenho feito até o momento é ler sobre esse fenômeno e assistir aos trailers expostos em aeroportos, TV e metrô.
Normalmente eu concordaria que não estou autorizado a emitir opinião sobre o assunto com tão pouco conhecimento. No entanto, creio que esse critério não se aplica quando o conteúdo a ser analisado é pornografia ou romance erótico. Portanto, entendo que a proposta dos Cinquenta Tons pode ser respondida à luz das Escrituras.
Não é necessário assistir a cada detalhe dessa trilogia para concluir que, no geral, sua mensagem é que o sexo pode ser praticado sem compromisso, de maneira egoísta, manipulativa e até violenta, desde que haja prazer ao final. Christian Gray, o nome do personagem principal, é alguém que usa e abusa de mulheres para obter o prazer sexual. Por outro lado, Anastácia, é alguém que se deixa dominar e ser abusada com o mesmo propósito. Daria até para ressaltar a estranha escolha feita pela autora dos nomes dos personagens principais, visto que Christian significa “cristão” e Anastácia, “ressurreição”, dois termos muito usados no cristianismo. Mas o objetivo deste ensaio é notar como a proposta dos Cinquenta Tons contraria o ensinamento bíblico e, por isso, não deveria ser apreciada pelos cristãos.
1. Sexo é uma expressão de amor e compromisso que reflete o sublime amor de Deus. De fato, sexo e todos os fatores físicos, emocionais e espirituais que o envolvem, são dons de Deus que ordenou a fecundidade humana (Gn 1.28). O contexto no qual esses dons podem ser desfrutados é o casamento sem mácula, no qual homem e mulher podem se relacionar sem se envergonharem (cf. Gn 2.15). Todavia, a pornografia e a literatura erótica zombam desses dons divinos, reduzindo o sexo ao mero envolvimento casual e praticado para a autogratificação. A mensagem dos Cinquenta Tons traz confusão à mente humana e obscurece o entendimento, pois glorifica o profano e despreza o sagrado.
2. Pensamentos lascivos conduzem a ações lascivas. O propósito de imagens e palavras eróticas é estimular o desejo sexual, mas geralmente de maneira corrompida. Como já foi dito, o desejo sexual não é mal em si, mas o estímulo do mesmo de maneira que contraria o padrão de Deus é pecaminoso e nocivo. O problema é que o cultivo desse desejo acaba resultando em comportamentos condenados pela Palavra de Deus. Seria correto afirmar que a literatura erótica e pornográfica não está interessada em ajudar casais a desenvolver relacionamentos mais sadios e santos. Mas as fantasias sugeridas por esse conteúdo são perigosas, pois conduzem a comparações doentias, enfraquece o comprometimento e debocha da santidade. Além do mais, aquele que muito fantasia, um dia desejará também praticar o que foi fantasiado.
3. O gênero de sexualidade encontrado nos “Cinquenta Tons” é um dos mais perniciosos. Na verdade, a sexualidade promovida por essa literatura é o sadismo ou o sadomasoquismo. De acordo com os seus defensores, a dor, a opressão, o sofrimento e a violência são fontes do prazer profundo. Nada poderia ser mais pernicioso do que isso! A perspectiva bíblica é que sexo é um meio de expressar cuidado e amor ao cônjuge. Nesse processo, tanto marido quanto esposa se entregam um ao outro carinhosamente e com alegria. A dor, a opressão e a violência acabam contrariando a natureza essencial do ato sexual.
4. O fato de se tratar de uma literatura fictícia não significa que o seu consumo seja sem consequências. De fato, não há literatura neutra, desprovida do propósito de influenciar seus leitores e nem filme que apenas entretenha seu público. Tudo o que penetra na mente acaba influenciando a cosmovisão, as emoções, o comportamento e os relacionamentos. Dessa maneira, não há nada que seja “simplesmente inocente”. Os consumidores dos Cinquenta Tons logo serão influenciados a pensar e agir em suas categorias e a considerar se o conteúdo desse material não poderia, de fato, ajudar em seus relacionamentos.
5. A Bíblia exorta a que sejamos criteriosos com o que permitimos moldar nossos pensamentos e desejos. Nesse sentido, o apóstolo Paulo escreveu aos filipenses: “Finalmente, irmãos, tudo o que é verdadeiro, tudo o que é respeitável, tudo o que é justo, tudo o que é puro, tudo o que é amável, tudo o que é de boa fama, se alguma virtude há e se algum louvor existe, seja isso o que ocupe o vosso pensamento” (Fp 4.8). Qualquer pessoa honesta admitirá que o conteúdo dos Cinquenta Tons não passa nesse teste proposto pelo apóstolo. Portanto, o que deve ser sacrificado não é exortação bíblica, mas qualquer literatura ou conversação que a contrarie.
Finalmente, é preciso esclarecer que o cristão não necessita “estar por dentro” de todos os assuntos de impacto social. O fato de muitas pessoas estarem discutindo os Cinquenta Tons não é uma desculpa e nem uma sanção para que o crente se envolva com esse tipo de conteúdo. Os olhos do crente não precisam contemplar tudo que é divulgado como popularmente aceito, por mais tentador que seja. Em um artigo sobre esse assunto, Marshall Segal, membro da equipe do ministério Desiring God, lembra que “aqueles que optarem por ver menos hoje, poderão contemplar infinitamente mais na eternidade”[2], pois Jesus disse que os limpos de coração verão a Deus (Mt 5.8).
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Notas:
[1]SEGAL, Marshall, “Fifty shades of Nay: Sin is a needle, not a toy”. Disponível em: www.desiringgod.org. Acesso em: 10.02.2017.
[2]Cf. Fifty shades of Gray. Disponível em: https://pt.wikipedia.org/wiki/Fifty_Shades_of_Grey. Acesso em: 10 de fevereiro de 2017.
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Autor: Rev. Valdeci da Silva Santos
Fonte: IPCB - Igreja Presbiteriana do Campo Belo
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